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Três Lagoas

?A charge serve para mostrar um fato importante, mas morre no dia seguinte? diz Nicolielo

Nicolielo tornou-se chargista internacional na época da ditadura

A exposição ?Festa Baile?, com as obras de Nicolielo, segue até o dia 5 de julho -
A exposição ?Festa Baile?, com as obras de Nicolielo, segue até o dia 5 de julho -

Ele teve charges publicadas em vários jornais e revistas do Brasil e de outros países. Tornou-se chargista internacional na época da ditadura, quando não podia publicar seu trabalho em território nacional. Viveu em um período em que quase tudo era proibido e hoje acompanha as manifestações a partir das quais as pessoas exercem o direito de ir para as ruas e protestar contra a corrupção e várias outras mazelas sociais. Estamos falando do chargista e artista plástico, Antônio Carlos Nicolielo, de 65 anos, um dos colaboradores do Jornal do Povo. Ele iniciou sua atividade profissional em Bauru (SP), onde trabalhou como repórter, redator e chargista político dos jornais Folha do Povo, Jornal da Cidade e Diário de Bauru. Foi também Diretor de Arte do Departamento de Marketing do Banco Noroeste do Estado de São Paulo, editor de arte da Revista Noroeste, capista e ilustrador das revistas Visão, Veja, Status, Viaje Bem, Futuros/Agronegócios e da Bolsa Mercantil & Futuros de São Paulo.

Nicolielo foi chargista e ilustrador de jornais como Diário de S. Paulo, Diário da Noite, Folha de S. Paulo e Folha da Tarde. Também foi colaborador de O Pasquim. No exterior, publicou seu trabalho em países como Alemanha, Canadá, Grécia, Alemanha, Bulgária e Polônia. Em 1985, foi escolhido e premiado pela Comissão Editorial Europeia como um dos mais importantes cartunistas do mundo. Na entrevista especial desta semana, o Jornal do Povo conversou com Nicolielo, que está com os seus trabalhos expostos na Biblioteca Municipal Rosário Congro, em Três Lagoas.

Jornal do Povo – Como o senhor começou nessa profissão?
Nicolielo – Desde pequeno, gosto da arte da caricatura. Por isso, comecei a batalhar e publiquei meu trabalho na maior parte da imprensa brasileira, menos no Estadão. No final da década de 70, começo de 1.980, o diretor do Museu de Artes de São Paulo, que gostava do meu trabalho, pediu que eu fizesse uma exposição, e eu a fiz com papel. Daí ele disse, você não é desenhista e sim pintor. Disse que eu deveria pintar em tela, porque permitiria maior durabilidade. Então, comecei a fazer isso que estou fazendo. Hoje, as minhas charges são publicadas principalmente na internet. Além disso, tenho-as publicado no Jornal do Povo, de Três Lagoas, e na Folha da Região, de Araçatuba. 

JP-Quantas charges o senhor faz por dia?
Nicolielo– Uma por dia. Levanto e vou fazer a minha charge.

JP– Quanto tempo leva para concluir uma charge?
Nicolielo – Pode sair na hora, pode demorar três horas, depende da informação. Às vezes, eu planejo o que vou fazer até antes, porque o momento político me dá assunto. Às vezes, adianto o meu trabalho quando preciso viajar.

JP– E como tratar os acontecimentos sérios com humor?
Nicolielo – O humor cabe em qualquer lugar, uma vez que desmascara, mostra um tipo de verdade. Quer dizer, brincando, mostra uma verdade.

JP– Hoje, a população consegue fazer a leitura correta de uma charge?
Nicolielo – Consegue. Eu mesmo subestimava muito a molecada, mas percebo que os jovens são muito perspicazes, inteligentes e sacam o que a gente está fazendo. Percebemos isso pelo número de admiradores.

JP– O que representa uma charge para o senhor?
Nicolielo – É um retrato momentâneo, principalmente do momento político. Mas não é só nesse campo, pois também são explorados temas de caráter social e psicológico. Enfim, a charge engloba várias possibilidades temáticas. Geralmente, retrata mais a questão política como um registro do momento atual. A charge serve para mostrar um fato importante, mas morre no dia seguinte, como a notícia. Ela serve mais como um registro histórico. Se você pegar todas as charges em uma coleção de jornal, terá o conhecimento dos momentos históricos, através da figura, da imagem.

JP– Existe uma série de charges ou uma em especial que o senhor destaca como mais importante em sua carreira?
Nicolielo – Não, pois há charge com a qual você mesmo vibra, pula de alegria, mas é difícil saber. Há charge que faz a gente dar risada. Tem uma recente em que o cara pede vinagre e todo mundo saiu correndo. Achei gozada! Então, a gente vibra com a charge.

JP– E de onde vem a inspiração?
Nicolielo – Não sei. Você nasce com aquilo e acumula. Eu tive sorte de nascer em uma cidade gozada. Na minha cidade, [Nova Europa] todo mundo brinca. Então, acho que é isso, essa veia cômica que a gente tem e brinca com tudo.

JP – Atualmente, existem bons chargistas? Qual deles o senhor admira?
Nicolielo – Tem muitos. Há uma molecada boa que está saindo na Folha. O problema é que, apesar de ter muitos chargistas bons, eles não têm onde publicar, a não ser em sites.

JP-Chargista é uma profissão valorizada?
Nicolielo – Não. Ninguém vive de jornalismo, de charge política. Sou formado em Direito, mas nunca exerci. Fui para o jornalismo direto, mas eu tinha empregos, pois sou muito criativo. Trabalhava com propaganda, em jornais e revistas. Trabalhava em outras áreas e não apenas fazendo charge. Trabalhei na área de criatividade para sobreviver, pois ninguém sobrevive somente com isso no Brasil. O pessoal tem um pouco de medo da charge, porque os jornais geralmente são comprometidos. Esse não é o caso do Jornal do Povo, porque publica as minhas charges, mas alguns jornais recebem estímulos de empresas e de políticos. Não tenho medo de falar isso porque é verdade.

JP– Há charges do senhor que causaram alguma polêmica?
Nicolielo– Sim, eu vivi na época da ditatura. Comecei a publicar em 1968, em plena ditadura. Já passei apertos, tive que sumir um tempo. Sou da turma que viveu todo esse clima político. Muitas coisas não podíamos publicar. Eu me tornei chargista internacional, porque não podia publicar na imprensa nacional. Então, me especializei na política internacional e mandava meu trabalho para fora, pois não tinha jeito de publicar aqui, já que era proibido.

JP– O senhor está falando em ditadura, período em que quase tudo era proibido, e agora nós estamos vivendo em um momento completamente diferente, em que as pessoas têm o direito e estão se manifestando, indo para as ruas. Como analisa isso?
Nicolielo – Acho que isso tudo estava demorando né? [sic] Tanto que a presidente, chamo-a assim porque não existe presidenta, manifestou-se através de um plebiscito. Hoje, há muita abertura. As pessoas podem ir às ruas, a própria Polícia Militar está apoiando. Vejo esse momento em que o país vive hoje como maravilhoso, muito bonito.

JP– Como o senhor analisa o governo da presidente Dilma Rousseff?
Nicolielo – É um governo típico do PT, uma coisa muito escondida. Não existe clareza. É muito esquisito isso e o povo está sabendo dessa sacanagem, dessa ditatura socialista.

JP– O senhor deixou a cidade há seis anos. Ao retornar ao município agora, percebeu alguma diferença?
Nicolielo – Sim, mudou tudo. A cidade tem vivenciado um “boom” de crescimento muito grande em seis anos. Esse movimento é muito bom. Três Lagoas melhorou muito e espero que continue nesse ritmo de progresso.

JP– Tem saudades de Três Lagoas?
Nicolielo – Tenho, pois é uma cidade muito gostosa. Tem água, lugar para andar de caiaque e pescar. Eu gosto de muita água.

JP– O senhor pretende morar novamente em Três Lagoas?
Nicolielo – Não, hoje estou em Nova Europa, cidade que fica próxima a Araraquara, onde tenho o meu ateliê. Hoje, com a internet, você faz de tudo em qualquer lugar. 

JP– E falando agora nessa exposição que está acontecendo na Biblioteca Rosário Congro, como surgiu o convite?
Nicolielo – Como tenho fecebook, a Vickie Vituri Garcia, diretora do Departamento de Cultura], convidou-me. Tive a maior felicidade de retornar a Três Lagoas, cidade que deixei há seis anos. Eu morei aqui durante 15 anos, daí fui embora. Agora, recebi esse convite e fiquei muito feliz.

JP-Quantas telas estão expostas aqui na Biblioteca?
Nicolielo – Essa exposição é composta de vinte telas, mas tenho algumas na galeria. Então, consegui colocar dezoito. Veio-me uma ideia de dança, de baile. Então peguei os motivos das minhas pinturas antigas e coloquei todo mundo para dançar. As pessoas que vierem prestigiar vão ver que tem baile em todo lugar. Na rua, na praça, no sebo, no circo, em tudo quanto é lugar. Todas as charges que fiz coloquei para dançar.

JP– As pessoas podem adquirir alguma tela nessa exposição?
Nicolielo – Tenho um minitrailer e viajo pelo Brasil com essas exposições. Então, chego e monto a exposição. Geralmente, quando a pessoa quer comprar faz a encomenda. No meu ateliê faço o trabalho, mas na hora não.