O número de estelionatos diminuiu em Mato Grosso do Sul nos últimos dois anos, mas, em contrapartida, os golpes virtuais aumentaram quase 10% em 2023, se comparado com o ano anterior.
Os dados foram divulgados no Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024. O documento se baseia em informações fornecidas pelas secretarias de segurança pública estaduais, pelas polícias civis, militares e federal, e entre outras fontes oficiais de Segurança Pública.
Segundo o anuário, foram registrados 13.647 estelionatos em 2022 no estado e, em 2023, o número diminuiu para 13.357. Já no ambiente virtual, foram registrados 5.027 golpes em 2022, e os casos aumentaram para 5.414 no ano passado.
Há vários fatores que contribuem para o aumento do estelionato virtual, e entre eles está a pandemia, como explica o desembargador Ruy Celso Barbosa Florence, da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
"Primeiramente, a pandemia fez com que as pessoas fossem obrigadas a utilizar os meios virtuais. Essas pessoas foram, na verdade, se equipando, comprando computadores, notebooks, celulares, e os criminosos também se ocuparam. Os próprios bancos acabaram fazendo uma série de ofertas através dos seus sites, através das suas correspondências virtuais e isso facilitou também aquelas pessoas mal intencionadas de como utilizar disso. Então você recebe hoje e-mails, SMS, você recebe mensagens pelo WhatsApp, oferecendo alguma coisa. São muitos golpes e se um cair, o número já é grande devido a quantidade", explicou o desembargador.
A relação do acesso a internet com o aumento dos golpes é também explicada pelo Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Fernando Nogueira.
"A internet é uma ferramenta que revolucionou a humanidade, aproxima as pessoas e facilita nossas atividades. Mas, por outro lado, ela também criou uma ferramenta em que hoje o criminoso, ao invés de te abordar, colocar uma arma na sua cabeça, ele usa a internet a seu favor e ele poder se esconder e praticar um crime e, ao mesmo tempo, ter a efetividade de realizar vários golpes com um só sistema, que é a internet. Então, essa tendência do anuário não é porque está tendo um combate inclusivo da polícia aos estelionatos tradicionais, e sim porque o crime virtual é muito mais fácil na prática das pessoas caírem", afirmou o especialista.
E é justamente no ambiente virtual, que um desses golpes conseguiu atrair a atenção da coordenadora escolar, Raquel Ricco, que pensou estar participando de uma promoção pela internet. Ela fala sobre a dinâmica do golpe e que conseguiu escapar a tempo de entregar dados importantes para os criminosos.
"Eu cai em um golpe de uma pizzaria entrou em contato comigo dizendo ser nova na cidade e que, com alguns dados meus, eles fariam cadastro no banco de clientes. Eu mandei meus dados no número do meu telefone e eles falaram que iria chegar um código de confirmação no telefone. O código chegou e passei para eles, nem me atentei à mensagem junto com o código. E aí meu WhatsApp ficou bloqueado, eles só não conseguiram entrar no meu aplicativo porque eu tenho um bloqueio duplo, que precisa também de uma senha. E eu percebi que eu caí no golpe quando eles pediram o próximo código que chegaria. Aí que eu li a mensagem anterior e vi que era para pegar o meu WhatsApp, entrei em desespero e esperei algumas horas até conseguir meu WhatsApp de novo", contou Raquel.
No caso da Raquel, ela não realizou nenhum boletim de ocorrência e pediu apenas para que amigos e conhecidos denunciassem o perfil criminosos nas redes sociais, que foi excluído horas depois.
O caso que aconteceu com a Raquel acontece com diversas pessoas todos os dias. O especialista em segurança pública, Fernando Nogueira, também falou a dificuldade em coibir este tipo de crime, no qual é muito difícil encontrar os verdadeiros autores e, muitas vezes, o processo é demorado pela justiça. Ele explica o que precisa ser feito para aumentar a eficácia do combate aos golpes virtuais.
"Necessariamente a legislação tem que se aprimorar, ela tem que ir adiante dos criminosos, para que os órgãos de investigação dentro das suas competências tenham acesso às informações com mais agilidade, para que realmente você consiga proibir esses crimes virtuais. Porque, como a internet a gente fala que ela é um mundo onde você não localiza as pessoas, existe forma de localizar, existe ferramentas, mas ainda elas são muito restritas e nós precisamos de legislação que nos permitam acesso a alguns dados, algumas informações, para que essa investigação tenha celeridade. Porque, desde que você chegue do hospedeiro da onde está saindo essas informações, isso leva tempo e até lá a pessoa ou mudou ou praticou vários estelionatos virtuais e isso então acaba", concluiu Fernando.