Com hospitais lotados, filas nas unidades de urgência e pacientes aguardando por leitos durante horas e até por dias, Campo Grande vive uma crise na rede pública de saúde.
Em meio ao aumento dos casos de doenças respiratórias, a cidade enfrenta déficit de até mil leitos, estrutura hospitalar defasada e sobrecarga de profissionais, cenário que reacendeu o debate sobre a urgência de investimentos e medidas de longo prazo.
Nesta semana, o caso de uma médica que recebeu voz de prisão por suposta omissão de socorro na UPA Coronel Antonino trouxe à tona a pressão vivida por servidores da saúde.
Segundo o Sindicato dos Médicos, a profissional atendeu o paciente, mas, sem leito disponível, o acomodou em uma cadeira — o que gerou indignação da família e a intervenção da polícia.
“Falta estrutura, faltam leitos e sobra pressão”, resume o presidente do Sinmed, Marcelo Santana.
De acordo com o sindicato, a cidade passou por forte crescimento populacional sem expansão proporcional da estrutura hospitalar.
“O último grande hospital construído foi o Regional, em 1994. A população cresceu, mas os hospitais continuam praticamente os mesmos”, alerta Santana, que também chama atenção para o impacto emocional nos profissionais. “É uma rotina exaustiva, que compromete até a qualidade do atendimento”.
A rede pública opera, atualmente, com todos os leitos contratualizados pelo SUS ocupados. Nessa quarta-feira (2), a lista de espera por vagas chegou a reunir 195 pacientes adultos e 18 crianças, segundo a Secretaria Municipal de Saúde.
A sobrecarga é agravada por pacientes vindos do interior e por uma rede que opera abaixo dos parâmetros internacionais. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda de 3 a 5 leitos por mil habitantes. Com quase 900 mil moradores, Campo Grande deveria ter entre 2.694 e 4.490 leitos, mas tem apenas 2.564 — e apenas 1.514 deles são destinados ao SUS.
Para a secretária municipal de Saúde, Rosana Leite, a cidade sofre os efeitos de um sistema saturado. “Temos mais de 1,4 milhão de cartões SUS ativos. Mesmo com o projeto do Hospital Municipal e a ampliação do Hospital Regional, ainda faltam de 500 a mil leitos”, explica.
Segundo ela, a Prefeitura busca, junto ao governo federal, novos repasses para ampliar a rede e contratar mais profissionais. Medidas emergenciais já estão em curso. Entre elas, o deslocamento de equipes volantes para as unidades mais sobrecarregadas e a intensificação da vacinação contra o vírus Influenza.
“Estamos avaliando o agravamento das doenças respiratórias, e entramos agora com a campanha de vacinação para proteger crianças e idosos”, afirmou a gestora. Outra ação foi o reforço na segurança das unidades de saúde, com monitoramento por aplicativo — semelhante ao adotado nas escolas.
O déficit de leitos também pressiona as UPAs e provoca longas esperas. A auxiliar administrativa Marciana Neto, por exemplo, passou mais de 14 horas aguardando atendimento para o filho, uma criança com necessidades especiais.
“Ficamos a noite inteira na UPA esperando uma vaga. Se ele, que é prioridade, demorou, imagina as outras crianças”, desabafa a mãe.
Além da superlotação, a Prefeitura e a Câmara Municipal apontam outro gargalo: a procura indevida por atendimentos de urgência. “Muita gente vai às UPAs com sintomas leves, que poderiam ser tratados nas unidades básicas”, alerta o vereador Maicon Nogueira. Já o vereador Fábio Rocha afirma que o Legislativo seguirá fiscalizando o funcionamento da rede para garantir atendimento digno.
Enquanto isso, a orientação da gestão é que a população procure os postos de saúde para casos de menor gravidade.