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ENTREVISTA

Decisão do STF sobre desapropriação em casos de crimes ambientais gera alerta sobre segurança jurídica no campo

Medida vale para casos com dolo comprovado em crimes ambientais; Advogado defende transparência nos critérios e ampla defesa ao produtor rural

Medida vale para casos com dolo comprovado em crimes ambientais - Foto: Reprodução/Governo de MS
Medida vale para casos com dolo comprovado em crimes ambientais - Foto: Reprodução/Governo de MS

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autoriza a desapropriação de imóveis rurais em casos de desmatamento ilegal ou incêndios dolosos, desde que fique comprovada a responsabilidade do proprietário, reacendeu debates sobre segurança jurídica no meio rural.

O tema foi abordado na manhã desta terça-feira (29) no programa Microfone Aberto, da Massa FM Campo Grande, em entrevista com o presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS, advogado Thiago Amorim.

Segundo Amorim, a decisão — proferida de forma monocrática pelo ministro Flávio Dino — representa uma reafirmação de princípios já previstos na Constituição de 1988 e no Código Florestal de 2012, que vinculam a função social da terra à preservação ambiental. No entanto, ele alerta que a forma como será feita a fiscalização e a comprovação de dolo ainda gera incertezas.

“O que causa efetivamente insegurança jurídica é a ausência de critérios claros sobre como essa fiscalização será realizada”, afirmou.

Advogado Thiago Amorim nos estúdios da Massa FM Campo Grande – Foto: Fernando de Carvalho/Portal RCN67

O jurista destaca que a responsabilização só poderá levar à perda da propriedade se for comprovada a intenção deliberada (dolo) do produtor rural de provocar dano ambiental — o que exige, segundo ele, garantias constitucionais como ampla defesa e contraditório.

“Não pode haver presunção de culpa. A Constituição estabelece que a presunção é da boa-fé e da inocência”, reforçou.

A decisão do STF prevê que a desapropriação será feita com pagamento em títulos da dívida agrária. Ainda assim, a ausência de regulamentação sobre quem fará as perícias, como se dará a fiscalização e em que instância — administrativa ou judicial — a comprovação de dolo será julgada, levanta preocupações no setor produtivo.

Amorim defendeu que o tema seja debatido no plenário do STF, e não apenas decidido individualmente por um ministro, dada sua relevância econômica e social. “Não tenho dúvidas de que essa discussão não pode ficar baseada só na opinião de um só ministro”, disse.

Sobre os reflexos sociais da medida, especialmente em períodos como o “Abril Vermelho”, tradicionalmente marcado por ações de movimentos ligados à reforma agrária, Amorim foi cauteloso.

Segundo ele, embora a decisão do STF não deva ser entendida como um gatilho automático para desapropriações ou ocupações, a falta de critérios legais transparentes também afeta esses movimentos, que acabam atuando de forma desordenada e com base em interpretações equivocadas.

Ao final da entrevista, Amorim reiterou a importância de que as instituições atuem com isenção e respeito à lei. “O produtor rural, em sua essência, não é degradador do meio ambiente. Pelo contrário, é um dos que mais preserva, porque depende da terra para sobreviver. O que esperamos é que a aplicação da lei seja feita com equilíbrio e justiça, sem viés ou generalizações.”

A decisão do STF ainda pode ser levada ao plenário para julgamento coletivo, seja por iniciativa do próprio relator, seja por provocação das partes envolvidas no processo. Até lá, segue valendo o entendimento de que é possível a desapropriação de imóveis rurais em casos de crimes ambientais dolosos, desde que comprovada a responsabilidade direta do proprietário.

Confira a entrevista na íntegra: