Na semana do feriado de Corpus Christi, junto com outros vários brasileiros e brasileiras, fiquei por muitas e muitas horas à espera de voo que decolasse do aeroporto de Brasília. No meu caso, foram nove horas à espera de avião que partisse rumo a Campo Grande.
Essa situação não é, infelizmente, problema exclusivo da capital federal. Na verdade, é algo que se repete em praticamente todos os grandes aeroportos do País há alguns anos.
Em outubro de 2006, foi registrado o chamado “Apagão aéreo”, quando atrasos em pousos e decolagens aconteceram devido aos efeitos da operação-padrão deflagrada por controladores de voo. A situação continuou pelos meses seguintes, inclusive com falhas no funcionamento dos radares do Cindacta-1 e 2.
Em março de 2007, houve greve dos controladores de voo e tumultos por todo o País. Em abril e maio, foram instaladas Comissões Parlamentares de Inquérito na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
O cenário se tranquilizou um pouco depois de algumas medidas tomadas pela Anac, mas periodicamente situações emergenciais se repetem. Em agosto 2010, 53% dos voos de uma empresa aérea atrasaram. Em setembro do mesmo ano, voos de outra empresa foram cancelados e a Anac determinou a suspensão da venda de bilhetes da empresa. Inúmeros atrasos se seguiram nos meses e anos seguintes.
Em suma, desde 2000, o cenário do setor aéreo é de crise permanente. Não podemos desconsiderar, no entanto, estimativa da Associação Internacional de Transporte Aéreo que afirma que a América Latina terá o triplo de passageiros em 2030. Serão 438 milhões comparados aos 145 milhões de 2010.
Assim, se considerarmos que a crise no setor aéreo se inicia com a sua desregulamentação na década de 1990, caminhamos para quase vinte anos de crise, que tem sido agravada em razão da ampliação do número de usuários. O número de passageiros saltou de 71 milhões em 2003 para 192 milhões em 2014 – e a expectativa é de que a curva de crescimento continue.
Há, pois, um claro descompasso entre o crescimento do número de passageiros e a infraestrutura existente, que é composta de três elementos principais: pistas de pouso e decolagem; pátios para estacionamento de aeronaves; e terminal de passageiros.
As ações do governo têm sido de natureza emergencial, para resolver situações críticas. Dessa forma, Brasil não está se preparando para criar uma estrutura capaz de atender às necessidades do País daqui a 30, 40 ou 50 anos.
O último movimento do governo federal foi depositar na iniciativa privada as esperanças de bem administrar os aeroportos brasileiros. Sou inteiramente favorável à privatização de aeroportos e, também, de outras instalações de infraestrutura.
Tenho dito que o Estado como operador direto de infraestrutura é um modelo superado. O papel do governo federal deve estar no planejamento, na regulação e na fiscalização.
No entanto, é preciso observar que a mera transferência para a iniciativa privada não é suficiente para que haja melhoria na qualidade dos serviços de infraestrutura. É preciso mais. Primeiro, cabe ao governo definir exatamente o que ele deseja. Não podemos também focar nossas preocupações apenas nos grandes eventos esportivos que estão por vir, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas.
Quais são os cenários desejados para daqui a 50 anos? Qual é o papel do setor aéreo no Brasil? Em outras palavras, o que pretende o governo? A partir desse passo, é preciso estabelecer as estratégias necessárias para cumprir o plano.
Os primeiros aeroportos leiloados foram três dos maiores do País: Guarulhos, Brasília e Viracopos e os vencedores não foram empresas operadoras de grandes aeroportos no mundo. De um lado, houve a temeridade de começar o novo modelo pelos grandes aeroportos, quando o ideal seria começar pelos médios, a fim de verificar o que funciona ou não. De outro lado, exigências maiores deveriam ter sido feitas nos editais para assegurar que a experiência em gestão aeroportuária fosse elemento importante para se participar dos leilões.
Acredito, contudo, que a privatização de aeroportos é uma boa estratégia. Feita, evidentemente, de modo organizado, com um modelo que incentive a participação de empresas experientes e dispostas a investir no setor.
Infelizmente, presenciamos diversos modelos convivendo simultaneamente. Há resquícios dos governos militares, com propósitos nacionalistas junto com ideais liberais da década de 1990, bem como iniciativas esparsas levadas adiante neste século para resolver problemas pontuais. Agora, há também as concessões cuja eficiência ainda é uma incógnita.
O governo deve agir. O resultado da omissão ou da inação atuais será certamente o fracasso.
Antônio Russo Netto é senador da República (PR/MS)