Na competitiva economia contemporânea, permeada de crises e caracterizada por concorrência acirrada, as empresas de todos os setores trabalham com margens de lucro cada vez mais apertadas. Todas? Não! Uma das poucas exceções, no mundo, encontra-se no mercado financeiro do Brasil. Nossos bancos “compram” o dinheiro dos investidores a juros de 9,75% ao ano e o “vendem” aos tomadores de empréstimos e financiamentos a 30% ou até 80%, com ganhos de 200% a 700%.
Assim, há plenas condições de se reduzirem os spreads bancários sem quaisquer contrapartidas do governo e da sociedade. Ou seja, a queda dos juros reais em nosso país depende, única e exclusivamente, da vontade política e da disposição dos bancos de baixar suas elevadas margens, contribuindo de maneira mais efetiva para o financiamento da produção, ampliação do consumo e estabilidade dos preços. Afinal, crédito abundante, com juros civilizados, é o grande segredo para o crescimento do PIB sem inflação.
Portanto, não resiste à lógica e ao bom senso a lista de 20 reivindicações apresentadas ao Ministério da Fazenda por Murilo Portugal, presidente da Febraban, como condição para os bancos atenderem ao grande anseio nacional relativo à diminuição dos spreads. Não há dúvida alguma de que a lucratividade dos bancos brasileiros está entre as maiores do mundo. Ninguém é contra o lucro, em especial daqueles que prestam bons serviços. A solidez de nosso sistema financeiro é elogiável, desejável e positiva para o País. Porém, tudo tem limite, e este encontra-se no equilíbrio do tripé de sustentação da operação financeira: liquidez, segurança e rentabilidade. Não se pode trocar as duas primeiras só pela terceira.
É possível reduzir os lucros hoje auferidos pelo sistema financeiro sem diminuir os depósitos compulsórios e os tributos, como tenta impor Murilo Portugal ao Ministério da Fazenda. Outrasreivindicações dizem respeito à utilização de parte das reservas dos planos de previdência como garantia dos empréstimos e o parcelamento dos tributos queincidem na renovação de um crédito para pagamento de outro empréstimo. Ora,estudos do Banco Central mostram que, mesmo considerando as despesas inerentes ao custeio, administração, inadimplência e compulsório, as margens das instituições financeiras continuam elevadas, por volta de 54%.
A incontinência reivindicatória do presidente da Febraban, contudo, parece realmente exacerbada: ele também coloca como condição para baixar os spreads, mudanças na lei do Cadastro Positivo, tornando a sua consulta menos complexa quanto à autorização do cliente e responsabilização do banco pelo uso da informação. Esse argumento também não procede. Com ou sem cadastro positivo, as informações hoje disponíveis sobre a capacidade de adimplência das pessoas físicas e jurídicas são mais do que suficientes para garantir a segurança das operações.
Está na hora de o sistema financeiro nacional, assim como ocorre nos países desenvolvidos e nos demais setores de atividade, passar a ganhar em escala, com mais produtividade. Assim, ao contrário do que Murilo Portugal afirmou, a bola da redução do spread não está com o governo. Está com a Frebraban, e todos os brasileiros querem jogar, pagando menos juros para investir, consumir e ser feliz!
*Ivo Barbiero, economista, é presidente da proScore, Bureau de Informação e Análise de Crédito.