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Bom vizinho: artigo em extinção?

Pesquisa recente  mostrou como anda a confiabilidade do brasileiro, onde as Forças Armadas lideram  com 75% e os partidos políticos ocupam a lanterna com míseros 7% de credibilidade. Curiosamente pela primeira vez foi incluída  a vizinhança entre instituições e grupos pesquisados. 

O resultado é no mínimo surpreendente: apenas 30% dos entrevistados tem bom conceito de seus vizinhos.  Os números retratam como andam as relações humanas, principalmente nas grandes cidades, onde presumivelmente a coleta de opiniões deva ter sido realizada. 


Mesmo admitindo-se margem de erro, a amostragem enseja reflexões e questionamentos. Os leitores das grandes cidades podem concordar usando argumentos variados, desde o estilo de vida, a falta de tempo e nenhuma identidade cultural, para se recolherem à sua ‘toca’ e ponto final.


Evidente que ficou na saudade os tempos em que os vizinhos eram mais íntimos: desde os pedidos de empréstimos do ‘café salvador’ –  ao remédio na madrugada fria para estancar a febre do filho. Hoje as famílias se bastam, notadamente nos bairros de classe alta onde os muros altos e os dispositivos de segurança isolam as pessoas. Cumprimentos são formais e apenas durante a operação do portão eletrônico. Cadeiras na calçada e crianças curtindo a bicicleta na rua são cenas exclusivas, mas não frequentes  inclusive de bairros da periferia.  


Não se pode esquecer também de algumas outras inovações comportamentais que influenciaram. Festas de aniversários e casamentos só  nos salões de aluguel; perderam o toque da pessoalidade. Agora é ‘proibido’ morrer em casa. Velório só nas funerárias, como se a morte não fosse parte integrante das nossas próprias vidas e a solidariedade dos vizinhos perfeitamente dispensável. 


Aqui vai um exemplo pessoal. Todos os anos saímos pela vizinhança para distribuir sacolas de mangas de nosso quintal. Em todas as casas a mesma coisa: após a recepção fria no interfone, vem aquela reação   agradável quando o objetivo da ‘visita’ é revelado.  As pessoas se mostram surpresas com a iniciativa/gesto e se desarmam.


Claro! É preciso distinguir situações, mas é possível rever a postura para construir pontes e derrubar muros onde vivemos. A pesquisa serve de alerta e convite para isso. Afinal, “nem sempre a grama do vizinho é mais verde”. Pense nisso. 

*Manoel Afonso é jornalista (www.manoelafonso.com.br)