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Brasil "anobelado"

Nos últimos dias, o mundo conheceu os nomes dos laureados com o Prêmio Nobel de 2011. Mais uma vez, desde que foi instituído em 1901, não há nenhum brasileiro destacado entre os vencedores. Ainda que a premiação concedida pelos comitês e institutos escandinavos sirva apenas como um parâmetro relativo de análise, seus resultados são emblemáticos. E a ausência deles, no caso do Brasil. De que adianta a presidente Dilma Rousseff pretender dar lições de condução econômica aos europeus e norte-americanos quando, em terras brasileiras, há uma carência extrema de investimentos básicos em educação, saúde, ciências, tecnologia e cultura? É nesse sentido que a análise dos números do Nobel pode servir como prisma do que esperamos, em amplo aspecto, em termos de desenvolvimento.
Por óbvio, sobram críticas à categoria mais conhecida da premiação, que é o Nobel da Paz. Em especial por alguns duvidosos galardoados na última década, como o presidente Barack Obama em 2009 e a Agência Internacional de Energia Atômica em 2005 (prêmio dividido com seu então diretor-geral, o egípcio Mohamed ElBaradei). Mas, em geral, os prêmios de Física, Química, Medicina e Literatura são justíssimos, concedidos a titulares de pesquisas importantes, profissionais técnicos e acadêmicos pioneiros e cidadãos que deram destacada contribuição à sociedade.
Considerando o panorama mundial, em 110 anos de existência do prêmio, o Brasil foi literalmente massacrado no ranking. Enquanto os brasileiros jamais tiveram um trabalho ou obra reconhecidos e dignos da honraria, países que primam nos investimentos em educação, pesquisas científicas, inovações tecnológicas e cultura despontam às centenas. É o caso dos EUA, por exemplo, com 331 vencedores do Nobel. Em segundo lugar está o Reino Unido com 116, seguido pela Alemanha, com 102 premiados. A França já conquistou 58. Nossa pátria-mãe, Portugal, ganhou quatro, sendo três deles muito recentes, com especial destaque para o Nobel de Literatura de 1998, conferido ao genial e saudoso escritor José Saramago.
Se não quisermos tomar como base as potências em crise do hemisfério norte, basta um rápido olhar para nossos vizinhos na América do Sul. A Argentina é líder continental, contabilizando cinco premiados: um Nobel de Química (1970), dois de Medicina (1947 e 1984) e dois da Paz (1936 e 1980). O Nobel de Literatura já desembarcou duas vezes no Chile: o primeiro para Gabriela Mistral (1945) e depois para Pablo Neruda (1971). A literatura também rendeu os merecidos louros para o colombiano Gabriel García Márquez (1982) e, no ano passado, para o escritor peruano Mario Vargas Llosa (2010). E ainda temos o venezuelano Baruj Benacerraf (1980) reluzindo entre os vencedores do Nobel de Medicina.
É fato que o Brasil tem nomes à altura da premiação. Bem poderia levar um Nobel de Medicina o médico e cientista Miguel Nicolelis. Brasileiros da estatura de Jorge Amado, Guimarães Rosa e Rachel de Queiroz poderiam tranquilamente ter erguido um Nobel de Literatura. O escritor Paulo Coelho, um dos homens mais lidos no mundo, que os arrogantes gostam de criticar e os presunçosos criticam sem ler, tem sua obra como extraordinário argumento de coroação. A falecida pediatra e sanitarista Zilda Arns e sua Pastoral da Criança foram cinco vezes indicadas ao Nobel da Paz. Até o ex-presidente Lula chegou à lista, por seus pseudoesforços internacionais no combate à fome. Nunca ganhamos. Nunca chegamos lá! Os rankings que lideramos são bem outros: o da violência; da corrupção, do tráfico de drogas e armas, dos portos, aeroportos e estradas mais precários; e tantos outros nesse nível. Triste assim.
Como no país das grandes competições que não levam a lugar nenhum, como o carnaval e futebol, ser preterido ou derrotado é sinônimo imediato de desdenho, certamente virão perguntas do tipo “quem julga isso?”, ou “a quem interessa esses rankings?” ou, ainda e pior, “por que desejar ganhar um Nobel?”. São questionamentos importantes, mas, com isso, desvia-se o foco do debate capaz de revelar que o Brasil, além do câncer da corrupção que aniquila a política enquanto ciência fundamental, investe muito mal sua riqueza, dilapida seu patrimônio e não projeta, com mínima seriedade, seu desenvolvimento enquanto nação democrática e liderança regional. A ausência histórica de um Prêmio Nobel desvela nossa situação mazelar. Mas é sempre muito mais fácil culpar o tapete pelo lixo que lhe é jogado embaixo. E seguimos sambando e batendo uma bolinha. Um Brasil “anobelado


Helder Caldeira é escritor e jornalista político