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Delação premiada e revanchismo

A delação também pode ser considerada como meio de defesa

A delação premiada está no centro de discussões desde que a Operação Lava Jato foi deflagrada. A delação é um mecanismo de investigação e obtenção de prova, consistindo no ato do acusado ou do investigado que, ao admitir a participação no delito, oferta às autoridades informações eficazes e capazes de contribuir para a resolução do crime. Críticos e defensores da delação digladiam-se discorrendo sobre sua validade, concepção, limites e seu fundamento ético-moral. Ambos possuem argumentos razoáveis e teoricamente embasados.

No relatório da CPI da Petrobras da Câmara Federal, no último dia 22, foram expostas críticas e sugestões, no intuito de lapidar o mecanismo da colaboração premiada. 

Duas delas chamaram a atenção da mídia e do público: a proibição de que seja firmada por acusados que estejam presos cautelarmente; e a proibição de que os delatores sejam defendidos pelo mesmo advogado.

A delação também pode ser considerada como meio de defesa.

Sobre a primeira, relaciona-se à ampla crítica atualmente sustentada de que as prisões cautelares estão sendo utilizadas como forma de forçar os acusados a delatar os demais coautores. 

De acordo com alguns juristas e advogados, a prisão preventiva estaria sendo decretada com o intuito de coagir os acusados a colaborar com a investigação e, apenas assim, conseguir a liberdade. Isso feriria de morte a “voluntariedade” da delação, requisito previsto em lei para sua validade.

Se isso estiver acontecendo, merece reprovação jurídica. Deve-se repudiar qualquer tentativa escusa de desrespeitar os direitos e garantias individuais. No entanto, proibir a colaboração premiada exclusivamente pelo fato de o acusado estar preso desrespeita a inexorável individualização de cada caso. 

A delação também pode ser considerada como meio de defesa, não apenas para buscar algum benefício imediato, como também para atenuar uma reprimenda inevitável.

Por isso, por mais que realmente o acusado preso cautelarmente padeça por estar privado de sua liberdade, não se pode tolher qualquer opção defensiva. E aqui o papel do advogado é fundamental, o qual deve indicar ao seu cliente as consequências de cada alternativa e ponderar pela melhor solução, intervindo contra eventuais abusos e coações.

A segunda sugestão que merece destaque é a impossibilidade de que mais de um acusado tenha o mesmo defensor. Também aqui não se pode concordar com a justificativa generalizada apresentada pelo relator, que se fundamenta no fato hipotético de que as versões podem ser combinadas.

Tal vedação violaria o princípio da ampla defesa ao restringir o acusado de contratar o defensor de sua confiança. Além do mais, ao prever que a colaboração seja confiável e eficaz, a legislação exige a corroboração de seu conteúdo por outras provas. Versões fantasiosas não terão validade sem amparo probatório.

A impressão é de que algumas das sugestões apresentadas no relatório, em vez de efetivamente contribuir para otimizar a delação, beiram o revanchismo.

É inegável que a delação é uma medida prevista no ordenamento jurídico pátrio e que está atingido resultados consideráveis, revelando esquemas criminosos extremamente perniciosos para o Estado. Em casos de alta complexidade que envolvem organizações criminosas, a delação é um profícuo meio de obtenção de prova e deve ser aperfeiçoado, não descaracterizado.

 

* Rodrigo Faucz é advogado criminalista e professor no UniBrasil Centro Universitário.