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Opinião

Desejo por mudança

Pedir que a Justiça brasileira seja rápida tornou-se clichê. Há tempos, setores importantes da sociedade civil organizada, especialmente a Ordem dos Advogados do Brasil, clamam pela necessidade de maior rapidez no trâmite dos processos. O discurso, logicamente, tem um fim: resgatar os valores da cidadania, imprimir maior credibilidade aos órgãos da Justiça e, mais abstratamente, fortalecer a crença na democracia e na República através do fortalecimento de uma das suas instituições: o Poder Judiciário.
Aliás, o problema é sério, por isso que impõe solução. Certo jurista afamado já disse que “o tempo é um dos maiores inimigos do Direito, contra o qual o Juiz deve travar uma guerra sem tréguas”.
Mas a despeito da boa vontade da fina flor da magistratura nacional, o remédio não é tão simples como se parece. Para se travar uma guerra sem tréguas, é preciso de armas.
À falta delas, alguns Juízes do Brasil, e aqui falo mais especificamente de Mato Grosso do Sul, estão começando a padecer de tanto estresse. Os (as) advogados (as), por sua vez, idem. Aliás, não são raros os casos em que os (as) advogados (as) devem implorar – repito, implorar – aos abnegados assessores, escrivães, escreventes e analistas judiciários a fim que, por exemplo, um alvará seja expedido, e os profissionais da advocacia que não gozam de staff de pessoal para isso fazem o papel do orador pregando no deserto.
Em meio ao caos, há ainda uma “briga” paralela, renhida, que, penso, impõe mediação: Conselho Nacional de Justiça e Judiciários locais não se entendem. Já se ouviu, da boca de muitos, que o CNJ em algumas decisões tem imposto limitações à liberdade de convicção do Juiz através de medidas heterodoxas. Verdade? Não sei. Vivo o mundo da advocacia, da representação. O que sei, e posso atestar, é que todos, sem exceção, profissionais do direito ou não, querem transformações e resultados.
Desde 1994 se vem emendando o Código de Processo Civil. Vontade de celeridade e economia sem sacrificar as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa sempre foi, e espero sempre será, o espírito que norteou a ânsia por mudança. Muito se fez, mas não foi suficiente.
A densidade do diagnóstico e a extensão do problema levaram a comunidade jurídica a agir, de novo. Comissão capitaneada pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça Luiz Fux, com a participação da Professora Tereza Alvim, do Professor Theodoro Júnior e de outros juristas da mesma envergadura, elaboraram anteprojeto de lei que, segundo alguns, tende a virar a lei ainda este ano.
O mote da mobilização é, evidentemente, amenizar o problema da morosidade e imprimir racionalidade a muitas situações em que iguais são tratados desigualmente.
Os processos não tramitariam mais como um “elefante velho”.  Alguns projetos de mudança dignos de nota: – eliminação de recursos; – maior obediência ao que o Superior Tribunal e o Supremo Tribunal Federal, em Brasília, decidem; – uniformização de decisões proferidas em processos assemelhados; – uniformização de regras para fixação de honorários advocatícios.
Todas as propostas, penso, são salutares. O cidadão, o homem das ruas, precisa acreditar naqueles que fazem o dia-a-dia do seu processo. Para se ter uma idéia, a fixação de honorários advocatícios em forma única, representa a consagração do princípio da igualdade, “tratando igualmente os iguais e desigualmente os desiguais nos limites dessas desigualdades”.
Valorizar o advogado. Remunerá-lo à altura da responsabilidade pessoal e social que assume simboliza a vitória do cidadão, seja ele profissional liberal, empresário, pecuarista, consumidor, etc.
O importante é que Judiciário e Advocacia estão juntos nesta caminhada. A comissão que está a mobilizar a reforma do Código é mista, formada por membros da magistratura e da advocacia. É de se deixar de lado, portanto, eventuais embates desnecessários, a exemplo do protagonizado recentemente pelo ilustre Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil/Seccional RJ e por membros da magistratura local que elegeram os advogados os bodes expiatórios do problema da morosidade da Justiça nacional.
O problema é de contexto, não pontual. Em breve, talvez este mês, membro da comissão do anteprojeto estará em Campo Grande, por iniciativa da Ordem dos Advogados do Brasil de Mato Grosso do Sul, reunindo em audiência pública a comunidade jurídica e os membros da comissão daqui, da qual honrosamente faço parte.
Oxalá as mudanças sejam convertidas em lei ainda este ano. Posso estar enganado, mas ninguém quer que as mudanças sejam concretizadas apenas “para deixar tudo como está”, para usar a célebre frase do escritor Tomasi de Lampedusa. Vontade política não falta.

Ricardo Trad Filho é advogado e professor de Direito