Pode ser meio utópico, diante do histórico brasileiro de mandar tudo para debaixo do tapete quando um assunto ou denúncia envolve poderosos. A lista de casos nacionais em que envolvidos deixaram a relação de culpados para se transformar em santos é imensa e começa desde bem antes da organização do país em República.
Acostumou-se a dizer que o país tem este negócio de inocentar poderosos como parte de sua cultura. Habituou-se a dizer que, culturalmente, o país é corrupto e ponto final. O próprio governo da presidente Dilma Rousseff, recentemente, arriscou dizer que a corrupção descoberta – ao menos, investigada – em contratos da Petrobras, vem desde sua criação, no governo de Getulio Vargas, na década de 1950, e atravessou governos, até mesmo os militares.
É praxe afirmar que tal governante manteve aquele subordinado no cargo porque se trata de cargo de confiança, mesmo que sua vida seja como um pau de galinheiro. O caso do ex-ministro Antonio Palocci, por exemplo, pode ilustrar bem essa citação. O médico petista de Ribeirão Preto tem uma ficha de rolos que faz inveja aos maiores – ou piores nomes – do submundo da vida pública. Mesmo assim, transitou com absoluta tranquilidade entre governos de São Paulo e de Brasília por longos anos, até ser finalmente execrado com participação da mídia.
A permanência de Nestor Cerveró, Paulo Roberto Costa, Renato Duque, Sérgio Gabrielli e Graça Foster, entre outros, no comando da Petrobras, nos governos de Dilma e do ex-presidente Lula, ocorreu pelo mesmo modelo de Palocci, até as investigações da Polícia Federal e ações da Justiça Federal ganharem as ruas.
E não poderia ser aceitável se demorasse ainda mais para o Brasil conhecer quem eram essas pessoas, exceto se governantes não mantivessem sobre eles suas redes de proteção. Todos caíram de seus cargos após ações que envolveram autoridades do Poder Judiciário, a mídia e o cidadão comum.
É preciso, assim, copiar este modelo, esta tríade de solução, que parte do conhecimento oficial das autoridades, a revelação pelos órgãos de imprensa e a sociedade.
O caso do assessor de Comunicação da Prefeitura de Três Lagoas, Sebastião Rodrigues Neto, quase já se encaixa neste mecanismo de limpeza do serviço público. As suspeitas sobre ele estão na mira de uma comissão da Câmara, instalada por solicitação da Corregedoria Geral do Ministério Público. O fato que se apura é público e notório. Falta apenas ser reconhecida a materialidade da prática, ou seja, dos serviços contratados e veiculados em revista e site de propriedade desse assessor.
Sebastião é o centro de um pacote de denúncias de favorecimento do poder público, especialmente às pessoas de sua família, através de contratos que claramente ferem a lei, no caso, o Estatuto do Servidor Público. Mas e daí? E a prefeita, o que fez até agora?
Será que ela não conhece os fatos aqui relatados? Afinal, o assessor investigado é do setor de comunicação da prefeitura e pode ter o controle do que a prefeita sabe ou não. Mais ainda, a prefeita já sabe do que se trata, mas aposta que o povo de Três Lagoas não levará em conta mais um caso que se encaixa em desrespeito à lei.
A saída, afastamento, demissão ou qualquer medida semelhante era o mínimo que se esperava da governante três-lagoense, e logo no surgimento das suspeitas. Mas, não. A chefe do Executivo prefere a esquiva ao dever de zelar pela administração e pelo seu grupo de assessores. E é evidente que esta é uma função exclusiva da prefeita, independentemente de questões partidárias ou políticas, porque os assessores do primeiro escalão devem ser de sua deliberação pessoal e intransferível. Ou não?
O certo é que a resposta deve ser dada à sociedade três-lagoense em data marcada para ontem. Antes que a suspeita de irregularidades a afetem – risco que todos os governantes correm ao esquivar-se de casos semelhantes.