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ELDORADO BRASIL: seria cômico se não fosse trágico

Em 2008, segundo o jornal Valor Econômico, o grupo JBS-Friboi e a MCL Empreendimentos criaram a empresa Florestal Investimentos visando desenvolver plantios de eucalipto na região Centro Oeste do Brasil, no caso específico, em Mato Grosso do Sul. E anunciaram um projeto audacioso: plantar 500 mil hectares voltados a produção de celulose, carvão vegetal, fabricação de móveis, produtos florestais e até combustíveis líquidos (etanol celulósico).

Em setembro de 2009, “A J&F Holding”, controladora da JBS S/A, anunciou mais um passo na diversificação dos negócios, qual seja a formação de uma empresa de reflorestamento de eucalipto para fins comerciais, a Florestal Brasil. A empresa nasce com um capital de R$ 1,1 bilhão tendo como sócios os fundos de pensão Petros, Funcef e a MCL Empreendimentos – está última uma empresa do ramo de “propriedades rurais”. Em dezembro daquele mesmo ano apresentaram à comunidade treslagoense o  RIMA da fábrica de celulose a ser construída no município de Três Lagoas/MS. Em março de 2010, o grupo recebeu a Licença de Instalação; em junho foi lançada a pedra  fundamental de construção da nova indústria, a Eldorado Papel e Celulose Ltda – por ocasião do aniversário da cidade de Três Lagoas.

O que impressiona é a velocidade como dois grupos empresariais – que não são do ramo industrial da celulose – conseguem aprovar a construção da maior indústria de celulose do mundo, iniciando a obra sem ter sequer a metade dos investimentos necessários para a construção do empreendimento que, atualmente, está orçado em aproximadamente 6 bilhões de reais. Diga-se relativamente porque na audiência pública anunciou-se investimento de 2,9 bilhões de  reais, porém no dia em que recebeu  a licença Prévia de  Instalação, o Jornal do Povo informou que serão investidos 3,5 bilhões, dos quais 500 milhões serão aplicados no plantio de eucalipto. Por ocasião do lançamento da obra no mês de junho de 2010, foi noticiado pela imprensa local o investimento de 4,8 bilhões de reais. Em abril deste ano de 2012, na abertura da I Feira Florestal em Três Lagoas, os representantes e seguidores afirmaram que a obra está orçada em mais de 5 bilhões. Para fechar a ciranda exponencial, o site da referida empresa informa investimentos na construção da fábrica na ordem de 6,2 bilhões.

Como é possível mais que duplicar o valor dos investimentos num período de pouco mais de dois anos? E não estamos falando em milhões de reais, mas em bilhões de reais. E, mais, num cenário de turbulência capitalista e arrefecimento do setor florestal.

Há outro conjunto de paradoxos que lançam dúvidas quanto à seriedade das informações em torno dessa empresa responsável pela maior indústria de celulose do mundo. Trata-se da quantidade disponível de matéria-prima para o funcionamento do negócio, isto é, a área plantada com eucalipto. Em relação a este assunto, as informações divulgadas na imprensa também são desencontradas, senão vejamos: no RIMA a empresa afirma que “a área reflorestada pela empresa na região sul-mato-grossense vem crescendo a cada ano. Hoje a Florestal possui cerca de 96.000 hectares entre áreas próprias e em parcerias, sendo aproximadamente 68.000 hectares em florestas de eucalipto”. Por ocasião do lançamento da pedra fundamental da  construção da indústria, o Jornal do Povo divulgou que a Eldorado Celulose possuía 40 mil hectares  plantados de eucalipto  no município de Três Lagoas e região. 

Todavia, para surpresa geral, no dia 12 de abril de 2012, foi divulgado pelo site da Prefeitura de Três Lagoas que “O projeto Eldorado Brasil conta com 88.000 hectares de florestas plantadas, sendo 31 mil hectares plantados em 2011 e 35 mil hectares em 2012”. Em resumo, significa dizer que, se a fonte da prefeitura for correta, em 2010 a empresa tinha tão somente 22 mil  hectares plantados  com  eucalipto. Em outras palavras, a Eldorado Brasil não tem eucalipto suficiente para produzir 1,5 milhão de toneladas/ano – conforme  prevê o projeto industrial. Neste sentido, é pertinente lembrar que um hectare de eucalipto na idade de sete anos produz em  média 200 m³. Para produzir uma tonelada de celulose são consumidos em média 3,5m³. A fábrica da Eldorado Brasil, segundo se divulga, está projetada para  produzir 1,5 milhão de toneladas de celulose/ano. Se para produzir uma tonelada de celulose  são necessários, em média, 3,5m³ de madeira, para produção de 1,5 milhão de toneladas/ano de celulose consumirá 5.250.000m³ de madeira. Em resumo, significa 26.250 hectares/ano de eucalipto na idade de sete anos – que é a ideal para o corte. Se  dos 88 mil hectares  plantados  de eucalipto,  65 mil foram plantados em  2010 e  2011, haverá um período de 4 a 5 anos, entre 2014 e 2017/18, sem matéria-prima para a indústria. Provavelmente terá que comprar eucalipto de outros produtores durante cinco anos até sua safra estar em ponto de corte. Se não bastasse, o presidente da Eldorado Brasil, José Carlos Grubisich, diz em bom tom que se pretende chegar a  5 milhões de toneladas de celulose/ano em 2021.

 A questão que não nos deixa calar é a seguinte: o que está por trás destes números inflados? Deste desencontro de informações? Estaria a empresa maquiando dados para sair na frente e atrair investidores, dentre eles o poder público – que é o grande financiador do setor por meio do BNDES. Inclusive há evidências desta necessidade de controle da matéria-prima para atrair recursos. Por exemplo, em 2011 o Valor Econômico divulgou que a liberação dos recursos do BNDES, para a construção da Fábrica Eldorado, estava condicionada a fusão das empresas Eldorado (fábrica) e Florestal Brasil (eucalipto), situação que foi plenamente atendida dando origem a Eldorado Brasil.

Enfim, são ainda apontamentos, mas que devem ser investigados, pois ações aventureiras/especulatórias no capitalismo produzem em curto prazo ganhos para uma minoria e, sem dúvida, danos de toda ordem para a maioria.