A ENAC – Agência Nacional de Aviação Civil da Itália – órgão similar à ANAC brasileira, multou a empresa aérea Ryanair em três milhões de euros por não prestar assistência aos passageiros durante caos ocorrido nos aeroportos europeus no mês passado, consequência da erupção do vulcão islandês. Acomodações e refeições não foram oferecidas àqueles que tiveram seus vôos cancelados, obrigatórios conforme leis locais. A despeito das penalidades e das noites mal dormidas na sala de embarque, vale salientar que a companhia irlandesa tem seus negócios baseados na filosofia low fare, low cost, em suma, oferecer serviços básicos pelo menor preço possível.
Esta estratégia, surgida em meados dos anos setenta através da congênere americana Southwest Airlines, propagou-se com extrema rapidez pelos diversos continentes. Sua visão, missão, mantra e obsessão, estão no corte de custos, por mais incomuns que possam parecer a princípio.
Em nome de preços baixos, aprendemos a fazer check-in, carregar malas, contorcer-nos em espaços exíguos e degustar barras de cereais. Áureos tempos de mordomias, serviço de bordo, lanches quentes, refeições saborosas, jornais do dia e lenços umedecidos.
Cada vez mais raros, podem ser encontrados nas classes executivas das companhias sobreviventes. Varig, Transbrasil e Vasp, ex-proprietárias da ponte-aérea, sucumbiram-se aos novos tempos de mercado desregulamentado e de baixas tarifas – base da vantagem competitiva de empresas como Gol, Web Jet e mais recentemente, a Azul.
Vejamos como funciona a mentalidade de uma companhia com foco em custos. Ao solicitar que os passageiros façam o check-in, diminuem a quantidade de funcionários necessários nos balcões de atendimento. Oferecer barras de cereais ao invés de refeições quentes reduz os custos logísticos com serviços terceirizados de catering e o peso em vôo, minimizando o consumo de combustível. Solicitar que os passageiros joguem o lixo gerado antes da aterrissagem evita os custos com limpeza e antecipa a próxima decolagem, abreviando o tempo em solo. Avião parado na pista é sinônimo de desperdício.
Completam o cenário, frotas modernas e homogêneas. Aeronaves novas e similares requerem menores custos com manutenção, estoque de peças de reposição e treinamento de pilotos. A Ryanair consegue ir além, cobrando por malas despachadas, comidas e bebidas consumidas a bordo, executando ao extremo sua doutrina. O velho ditado de que não existe almoço grátis é levado ao pé da letra.
Outro setor que se enveredou por esta estratégia foram os hotéis. Diversas redes ampliaram seu portfólio, criando marcas e soluções econômicas. Em seus saguões é comum ver hóspedes carregando malas, acessando notebooks, comprando refrigerantes em máquinas automáticas e fazendo ligações em telefones públicos. Em seus quartos, instalações espartanas somente com o necessário.
Serviços de quarto, lavanderia, áreas de lazer, piscinas, saunas e monitores podem ser encontrados em catálogos dos hotéis da rede. Conseguem, desta maneira, reduzir gastos com pessoal, manutenção e infra-estrutura, principais custos deste tipo de estabelecimento. Aos marinheiros de primeira viagem sugiro cuidado, haja vista que grande parte dos serviços é considerada adicional e não obstante, realizados pelo próprio cliente – acesso a internet, café da manhã, preparo de comidas e bebidas, desde que claro, pagos antecipadamente.
Posicionados corretamente na matriz estratégica de Michael Porter como baixo custo, crescem pela disciplina e foco com que conduzem seus negócios. Oportunidades externas, tais como a crise financeira mundial, o crescimento dos países emergentes e o ingresso de novos usuários têm favorecido este tipo de negócio. Ameaças também existem em todas as direções, podendo às vezes vir de cima, como é o caso do Eyjafjallajokull.
Basta saber quem irá pagar a conta, afinal a estadia em um hotel, mesmo que econômico, poderá custar diversas vezes o valor da passagem. Há o sério risco de o molho custar mais que o prato.
Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas e professor da Universidade Mackenzie