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Opinião

Neutralidade fatal

Neutralidade é um gesto de indiferença. Alguém, entre duas ou mais alternativas, diz que não escolhe nenhuma.
A neutralidade sempre tem um objetivo específico. Ela nunca é inocente ou ineficaz, embora quem a utiliza sempre acha que “tanto faz”, que não “há qualquer prejuízo”.
Não quero falar da neutralidade pessoal, que é uma decisão simples, entre pessoas. Não atinge nem há um grande número de prejudicados.
Falo apenas da neutralidade política, aquela que envolve milhões de pessoas.
O exemplo mais conhecido de neutralidade política é a Suíça, que durante a II Guerra Mundial se declarou e se manteve neutra. Nem com Alemanha nem com Aliados. Sem exército, sem armas, sem recursos financeiros para gastar no esforço de guerra, a Suíça acabou saindo do conflito como potência econômica, concentrando em seus bancos grande parte da riqueza mundial.
Entre duas alternativas, dificilmente não se pode escolher uma delas. A menos que haja um interesse em fazê-lo.
Tomemos o exemplo de Marina Silva, a candidata do PV que conquistou os votos de 20 milhões de brasileiros no último pleito eleitoral. Seus 20 milhões de eleitores aguardaram até poucos dias atrás uma definição da candidata sobre quem apoiaria no segundo turno, Dilma Rousseff ou José Serra.
Como pessoa, Marina tem o direito de ser neutra. Como líder, não. Como líder, espera-se dela que defina, ante a enorme importância das eleições para o Brasil, seu apoio à melhor das propostas em disputa. Não há proposta perfeita, mas uma delas deve se aproximar dos anseios de seu eleitorado.
Ao optar pela neutralidade, nesse caso, neutralidade política, deixou seus eleitores diante da opção entre os candidatos Serra e Dilma, sem nenhuma orientação de quem se aproxima mais de suas bandeiras, de seu eleitorado.
Despedida por Lula do cargo de Ministra do Meio Ambiente, teve sérias divergências com Dilma Rousseff, que pretendia (e conseguiu) atropelar a legislação ambiental na obtenção de licenças para hidrelétricas de Jirau e Monte-Belo. Lula demitiu-a sem se dignar a fazê-lo pessoalmente!
Se José Serra não é exatamente o que o PV deseja para o Brasil, ao menos poderia negociar um ministério (o próprio Ministério do Meio Ambiente ou o das Cidades) para continuar aplicando as teses do PV durante 4 anos.
Deixar 20 milhões de eleitores se orientação para voto no segundo turno, abrindo mão de sua imensa liderança, optando pelo silêncio, Marina presta um enorme desserviço ao Brasil.
Não defendo aqui um apoio para o PSDB. Poderia ser um apoio a Dilma Rousseff.
Omitir-se, contudo, é inaceitável para quem se dizia preparada para assumir a presidência do País e até se dizia habilitada às próximas eleições dentro de 4 anos.
Seus eleitores vão seguir seu instinto. Alguns até seguirão sua sugestão de neutralidade. A maioria decidirá por um lado ou por outro. Mas já estão sem líder.
A neutralidade pessoal prejudica a poucos. A neutralidade política prejudica a milhões. Afinal, está em jogo o futuro de nosso país. Opinião muito, muito pessoal, mas Marina sai das eleições como revelação no primeiro turno e decepção no segundo. Sua falsa neutralidade será fatal à sua carreira de líder, pois a firmeza e a coragem de decidir são virtudes que ela mostrou não ter.

João Campos é advogado, especialista em Direito do Consumidor