Sabido que o Superior Tribunal de Justiça deu nova redação a Súmula 323 incluindo em seu texto ideia de que o nome do devedor só pode ser mantido nos cadastros dos serviços de proteção ao crédito pelo prazo máximo de cinco anos, ressalvando, portanto, que tal situação independe da prescrição da execução. Vejamos, o texto antigo e o novo na sequência:
“A inscrição de inadimplente pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito por, no máximo, cinco anos”.
“A inscrição do nome do devedor pode ser mantida nos serviços de proteção ao crédito até o prazo máximo de cinco anos, independentemente da prescrição da execução”.
Sabemos que a Súmula 323 trata do prazo de manutenção da inscrição de nomes em cadastros de inadimplentes dos serviços de proteção ao crédito diante do que pontua os parágrafos 1º e 5º do artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor.
A nova redação trazida pelo STJ na Súmula 323 encerrou mais uma contradição jurídica cruel, que estava presente no cenário jurídico da matéria. Afinal, se ocorreu à prescrição da dívida, significa que o credor não mais poderá cobrar, não podendo mais compensá-la. Em outras palavras, a prescrição extingue a exigibilidade da dívida, mas não extingue a própria dívida que se transforma em obrigação natural, tanto que se a mesma for quitada não poderá ser repetida.
Desta forma, a dívida inexigível não constitui ameaça ao patrimônio do devedor. Pelo contrário, esse patrimônio enquanto garantia dos credores permanece inalterado, para suportar as dívidas exigíveis. Tal inalteração do patrimônio do devedor, relativo à dívida tornada inexigível pela prescrição que fica abalada sob o aspecto do direito de crédito do devedor com a permanência da inscrição do seu nome nos cadastros de proteção aos credores em razão da dívida prescrita. Mas a inscrição nos serviços de proteção ao crédito causa ao devedor da dívida prescrita uma sanção consistente da restrição do crédito na praça, como se ele estivesse obrigado a pagar uma dívida exigível, quando, na verdade, não há dívida exigível contra ele.
Assim, a admissão de manter o nome do devedor de dívida prescrita por cinco anos, independente de prescrição, inscrito nos órgãos de proteção ao crédito, seria o mesmo que aceitar a inscrição do nome do devedor por dívida subordinada a termo ou encargo ou mesmo à condição suspensiva. Para todos esses casos a obrigação existe, mas é inexigível. Entretanto, é pacífico que nos casos de dívida a termo, ou sujeita a encargo ou condição suspensiva, a inscrição do nome do devedor nos cadastros de maus pagadores somente pode ser efetuada quando a dívida se torna exigível.
O mesmo raciocínio da exigibilidade como condição para manter a inscrição do nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito aplicada ao caso da dívida prescrita impõe que, consumada a prescrição, o nome do devedor deve ser suprimido de tais cadastros. Não sendo desta forma, estaríamos formando odiosa discriminação e violando a ordem constitucional para infligir ao devedor uma punição, consubstanciada na restrição de crédito que experimentará em razão da inscrição do seu nome como mau pagador, a partir de dívida já não mais exigível, ou seja, estaria impondo ao devedor uma pena restritiva de direitos não prevista em lei — violando assim a Carta Cidadã.
André Marques é advogado, consultor, escritor e doutorando em Direito