*Jacir J. Venturi
Ouve-se, amiúde, que a criança e o jovem têm um aprendizado fugido, efêmero, superficial, pois não mergulha fundo nos conteúdos; que chegam com pouca base, escrevem mal, a oralidade é pífia e têm preguiça de pensar; que estudam apenas nas vésperas das provas e assim procedendo, aprendem rápido e esquecem igualmente rápido. São afirmações verdadeiras em relação à maioria dos estudantes de hoje, e reverter essa postura é papel precípuo da escola e da família.
Um texto ou um exercício mais complexo faz bem aos neurônios. Há muito mais sinapses em 10 minutos dedicados a um problema difícil – mesmo não resolvido – do que a resolução de três outros exercícios bastante acessíveis. Aprender um conteúdo mais profundo é uma atividade solitária e requer disciplina pessoal, um ambiente silente e muita determinação. Nossa cultura, em geral, pouco valoriza o mérito, o esforço, o rendimento escolar, diferentemente da maioria dos países desenvolvidos.
Não há mais barreiras geográficas e a clássica citação de Marshall McLuhan merece ser recordada: “a interdependência eletrônica recria o mundo na imagem de uma aldeia global.” O futuro concorrente do universitário de hoje não é tão somente o diplomado nas boas faculdades brasileiras, mas também em Shangai, Seul, Hamburgo ou no Vale do Silício. E nesse mundo competitivo, não há como obter conquistas sem uma intensa disposição e disciplina para o estudo e para o trabalho.
Um discente há 40 anos dedicava grande parcela do tempo de estudo em operações aritméticas braçais, ou em decorebas, hoje desnecessárias com a internet, smartphones e outros gadgets eletrônicos. Dito isso, sobrariam mais horas diárias à atual geração para desenvolverem o pensamento lógico, a criatividade, os valores, etc., através das leituras e da dedicação às matérias da área de exatas. No entanto, as notas baixas nas provas do Enem e no Pisa demonstram o oposto. São avaliações que requerem raciocínio, contextualização e compreensão de textos longos. Ou seja, habilidades cognitivas que só incorporam os leitores contumazes e estudantes que mergulham fundo nos conteúdos.
Atualmente é muito valorizado o profissional que compreende e produz bons textos e é capaz de expô-los em público com clareza, síntese, no formato de um arcabouço lógico. Sejamos cartesianos: aceitemos a realidade apesar do conjunto de incertezas que advêm das mudanças. Mas sejamos simultaneamente darwinistas: temos que nos adaptar. E, para tanto, nos apeguemos a dois hábitos que com o tempo se tornam hedônicos: o prazer de aprender e o prazer de pensar.
Para atingir os píncaros do saber, busquemos a metáfora portuguesa do Cabo do Bojador – aquele lugar difícil de ser alcançado –, conforme ilustra o verso de Fernando Pessoa: “quem quer passar além do Bojador, tem que passar além da dor”. Mas tem enlevo e conquista, e a dor se transforma em doce sabor. Sabor de saber.