Não fora tantas outras vezes, a gafe praticada na última quinta-feira, dia 26 de março, na recepção que o nosso presidente ofereceu ao primeiro-ministro Gordon Brown, da Grã Bretanha, que nos visitava oficialmente, poderia ter ampla repercussão internacional (ficou restrita à mídia), o que não ocorreu mercê a atitude diplomática e compreensiva da alta autoridade visitante, minimizando-a com seu silencio. Interpelado por um perspicaz jornalista inglês sobre sua declaração inoportuna, quão preconceituosa e descortês, de que a responsabilidade da atual crise econômica mundial era porque praticada pela ambição de banqueiros do hemisfério–norte e todos “brancos de olhos azuis”, nenhum era “índio ou negro”, o nosso presidente engasgou-se todo, enrolou-se nas palavras perdido no seu raciocínio, naturalmente já preocupado com a enrascada que praticara. O estrago estava feito e o constrangimento causado pela fala presidencial deixou patente aquela máxima popular de “quem muito fala acaba dando bom-dia p’ra cachorro”, e que sua excelência desconhece que a intimidade tem seus limites…
No dia anterior, em outra solenidade presidencial, a do lançamento do programa de “um milhão de casas”, também sua excelência com toda pompa e circunstância declarou que o dito plano não tinha prazo para concluir, como a indicar que diferentemente do que é protocolar e usual, também não tinha tempo para iniciar e que, portanto, proibia (!?) a todos nós cobrá-lo de sua consecução. Incrível!
O presidente quando fica diante de microfones, ou sobe aos palanques, e em havendo um mínimo de figurantes a sua frente, desanda a dizer o que lhe vem na telha, não importa sua responsabilidade de primeiro mandatário da Nação. Pode até merecer os aplausos dos desavisados, amantes da demagogia verbal, mas envergonha o País face a suas destrambelhadas e repetidas declarações.
Bom, chega das gafes do presidente. Vamos, caros leitores, para questões mais coerentes ao nosso dia-a-dia. Em artigo anterior nestas mesmas páginas, mencionei que a corrupção que se alastra, qual metástase celular, em diferentes corpos dos Poderes da República, alcança níveis jamais ocorridos em nossa história republicana. Pois, um prezado companheiro de ideal e que me honra sempre com sua leitura, lendo-o, indagou-me se haveria um meio coibidor de tanta malandragem no setor público, descrente se encontrava. Respondí-lhe ser difícil, isto porque mudanças (constitucionais) só ocorreriam se o atual Congresso Nacional (Senado e Câmara dos Deputados) não tivessem participação num processo de reformulação da Lei Maior – a Constituição. E por quê? Porque, nada obstante haver dentre os parlamentares que integram o atual Congresso, pessoas de mais elevado espírito público e, sem dúvida, sensíveis à necessidade de uma nova tomada de rumos para restabelecer o prestígio da instituição representativa do povo, a maioria não deseja seja alterado o statu quo vigente. Tudo tem que ficar como dantes no quartel de Abrantes…
Era deputado federal no período anterior ao da instalação da Assembléia Nacional Constituinte, em 1987, e lembro-me que o desejo de uma Assembléia Exclusiva para elaborar a nova Carta fora levantada por eminentes constitucionalistas com destaque o saudoso senador e professor Afonso Arinos de Mello Franco, porém foi ela hostilizada e poucos, no Congresso, foram seus adeptos (dentro os quais honrei-me postar). A gritaria contra foi grande e deu no que deu: confundiu-se a excepcionalidade da Constituinte com os trabalhos ordinários do Congresso Nacional, inclusive com a presença dos senadores-bionicos (aqueles não eleitos pelo voto popular). Vivi esse período, ora era constituinte, ora era deputado. Presenciei como resultado, os previlégios, hoje assentados e tão bem ampliados, se mantiveram, os princípios norteadores do sistema político entrelaçaram-se entre um presidencialismo forte e um parlamentarismo tíbio, consumando-se com o correr do tempo (mais de vinte anos da promulgação da Carta) nessa geléia que serve a mesa de uns poucos…
Ruben Figueiró de Oliveira é suplente de senador