Brasileiros nascidos depois de dezembro de 1992 experimentam pela primeira o sabor amargo de uma das fases mais difíceis do processo de destituição de um presidente da República.
Naquele mês e ano, o Congresso Nacional decretava a perda de mandato ao ex-presidente Fernando Collor de Melo, atual senador por Alagoas – um marco político fincado na história do país como uma das maiores decepções da vida pública, na queda de um governante que prometeu mundos e fundos aos eleitores e que se viu envolvido nos desmandos de gente que a ele era muito próxima. É o caso de agora?
No cargo de Collor de Melo assumiu o vice Itamar Franco. Sobre ele pairavam grandes dúvidas sobre capacidade e intrepidez exigidos pelo cargo – características que os brasileiros viram em Collor quando o elegeram dois anos antes da queda. Mas, a escolha de Itamar para a vice presidência deu-se exatamente porque á ele atribuía-se a capacidade de em uma eventualidade assumir o leme do país e conduzi-lo a um porto seguro. Não deu outra. Fez sucesso e estabilizou a economia nacional com o Plano Real.
Entre outras semelhanças com a troca de Dilma Rousseff por Michel Temer surge como diferencial o fato de que não há uma unidade em torno da mudança. Collor saiu de mocinho a bandido em um estalar de dedos; Dilma ainda carrega a faixa de “mãe do PAC” ou dos pobres, dada por Lula, seu mentor político. É nisso que sobrevive a resistência de parte dos eleitores quanto à sua saída.
Itamar não foi chamado de golpista. Na timidez que balizava sua forma de fazer política, o vice de antigamente fugiu dos holofotes. Temer tentou, mas sem sucesso, até porque nos tempos atuais a rapidez da informação é muito maior. Os meios de comunicação evoluíram tecnologicamente, e, por isso, a notícia se espalha como rastro de pólvora, assim como mentiras e boatos, que setores inconformados com o processo de impedimento espalham a toda hora.
Collor não tinha uma tropa de choque que o defendesse, como Dilma ainda desfruta. Por isso o tema golpe causa confusão nos desavisados que não conhecem os rigores da Constituição de 1988 e da lei de Responsabilidade Fiscal. Deputados, senadores do PT e o seu líder maior, Lula, não cansam de repetir a todo instante que Dilma não cometeu crime. Collor insistia com o bordão “não me deixem só” para demonstrar ao país que estava sendo abandonado.
Feitas as comparações deste dois períodos da história política, Temer encarna a figura de usurpador do trono para aqueles que lhe são contrários e, ao mesmo tempo, para um grande parcela de brasileiros a esperança dos que viram suas economias se esvaírem, mais de 11 milhões de empregos desaparecerem e o país atolado em uma crise que os nascidos pós-período de Collor de Melo não conheciam. Sem contar ainda, de milhares de empresas que encerraram suas atividades ou que viram cair substancialmente suas receitas. Por tudo, resta uma esperança, quem sabe, a única esperança de resgate para reparação de erros cometidos por Dilma e seu governo.
E como será possível a Temer recuperar todas as perdas? Pergunta difícil de responder. A economia está castigada por erros de gigantescos em decorrência do financiamento de programas populistas, de lançamentos de obras sem dinheiro provisionado e de concessões de desonerações que não deram retorno esperado, porque não aqueceram a economia.
Estimularam o consumo desbragado. Hoje o brasileiro está endividadado. Quanto tempo este conserto vai durar ninguém sabe.
É certo que o governo Temer terá a difícil missão de retirar a interrogação colocada sobre inumeráveis indagações sobre o que é possível se fazer para reconstruir a economia abalada de um país que está entre o sétimo ou e oitavo do mundo. Reduzir o número de ministérios, cortar cargos comissionados e estancar gastos que a receita não suporta – erros que Dilma insistiu em não corrigir constituem providencias mais do que necessárias.
Depois destas, surgirão outras, que não podem ser negligenciadas para se assegurar a retomada do crescimento. Nesta etapa, será função de Temer e de seu primeiro escalão devolver a confiança ao país não apenas para atrair investimentos externos, mas principalmente entre brasileiros que tocam suas empresas e ensejar a retomada do emprego, além de remover as dificuldades que o governo federal impõe com altos impostos, além de juros extorsivos que acabam reprimindo o crescimento da economia interna.
Temer teve capacidade de apresentar um ministério infinitamente mais qualificado do que o de Dilma. Sabe que ninguém governa sozinho e nenhum partido político é suficientemente forte para resistir à oposição que o cerca, por isso, seu ministério se apresenta como de coalização nacional.
Que seja um novo Itamar, que se cercou de brasileiros que queriam reerguer o país e o resultado foi positivo, mesmo que os frutos do seu mandato tenham sido colhidos mais maduros pelo seu sucessor, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Temer não terá, ao menos por enquanto, que recriar um modelo econômico e muito menos uma moeda como nos tempos de Itamar e FHC. Terá, sim, que administrar o que se arrecada e dosar os gastos, cortar cargos criados para agradar partidos da base aliada do governo Dilma e atuar como embaixador de uma esperança que o país carece. Terá que estabilizar a economia e adotar medidas para a retomada do crescimento.
Mas, não conseguirá fazer sozinho. E nem apenas com o PMDB, seu partido. Terá de aproveitar a força do Congresso e ganhar o apoio das ruas, que exigiram mudança. Consertar erros de Dilma e de seu governo, por exemplo, será demonstração de que sabe para onde mirar suas decisões.