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O último vogal

Vogal era o nome dado ao juiz leigo, classista indicado pelos sindicatos, para formar a Junta de Conciliação e Julgamento trabalhista, formada por um juiz togado, um representante dos patrões e um dos empregados.
A primeira Junta do Trabalho foi dirigida pela Dra. Cremilda, depois Dra. Mieko Miura, depois Enio Galarça de Lima e, já no prédio da Cândido Mariano, abaixo da Maternidade, pelo Dr. Eurênio de Oliveira, pai do Desembargador André Moraes, do TRT.
Em grande parte desses julgamentos, funcionou o Vogal patronal Sebastião Vieira D´Ávila, que se mudou para o andar de cima nesta madrugada, indicado pelo Sindicato dos Comerciantes de Campo Grande.
O outro, também lá no andar de cima, era José Lourenço, pelos empregados, indicado pelo Sindicato dos Bancários.
Trabalhei com os dois por longos anos.
D´Ávila era um vogal às antigas, ou seja, estava ali para defender o lado patronal, embora sempre lhe dissessem que, como juiz, ele devia ser imparcial. Para ele, ser indicado pelo sindicato dos patrões era uma missão e disso ele não abria mão.
Tão importante era para a categoria do Comércio que não deixaram que ele se afastasse da presidência do Sindicato dos Comerciantes quando foi eleito presidente da Federação do Comércio, entidade que foi sua vida e recebeu sua marca por longo período.
Afável, falando baixo, não era um presidente de entidade, mas embaixador de uma  categoria, de sua entidade. Quem o conhecia pela primeira vez tinha de ter paciência para ouvir a história de sua vida e de suas realizações à frente da Fecomércio.
Suas obras, o SESC, o SENAC, a descentralização por ele empreendida rumo ao interior, sua liderança à frente do Sindicato dos Comerciantes (depois varejistas) eram seu tema preferido.
Vogal. Gostava de lembrar, quando eu o encontrava e ele passava a se lembrar nossas audiências, quando ainda era vivo o “Zé Lourenço”, outro que deu sua vida ao sindicalismo de Campo Grande.
São velas que se gastaram a serviço de categorias, um pelos trabalhadores, outro pelos comerciantes. Falava com paixão das notícias de jornal que lia avidamente, logo pela manhã.
Ao seu lado, meu amigo e colega Fernando Camilo, testemunhou muito do que aqui estou contando em rápidas palavras, já que uma vida como a de D´Ávila não se resume, sob pena de lhe tirar o brilho.  Camilo (que nasceu no mesmo dia, mês, ano e quase à mesma hora que eu), sabe do que estou falando.
Na última vez em que falamos, Camilo me deu a notícia de que o nosso vogal estava corado, o sinal de que mais nos lembraremos dele, em contraste com a cabeleira mais branca que já havíamos visto.
Sei que Idelmar Mota Lima, Euclides Bezerra e outros velhos sindicalistas também reivindicarão o título de vogais, mas, que me desculpem, hoje se foi o mais velho, mais dedicado e mais representativo dos vogais.
Perto do que ele realizou, no sindicalismo em geral, os outros são ilustres consoantes.

João Campos é advogado especialista em Direito do consumidor