Da grandiosidade dos propósitos desse programa da ONU, que em menos de mil dias escoará seu prazo, no final de 2015, muito pouco foi atingido, a demonstrar a procedência dos debates cáusticos que o antecederam entre as nações, de um lado os idealistas e de outro os céticos, num encontro fundamental já eternizado pelo cinema.
Opinião
Os objetivos do milênio
Dono de um número inusitado de informações, o jornalista Washington Novaes, de O Estado de S. Paulo, imprime clareza solar à análise, fundamentado em sólidos e idôneos danos estatísticos; sentar sobre eles é o mesmo que fazê-lo sobre baionetas, como disse Talleyrand a Napoleão.
Num mundo de 7 bilhões de habitantes, 6 usam telefones celulares, 2,5 não tem instalações sanitárias em suas casas e mais de 1 bilhão defecam ao ar livre.
Não se ignoram os progressos da última década: a extrema pobreza diminuiu pela metade, caiu a mortalidade infantil, o acesso à água potável foi ensejado a 2 bilhões de pessoas e as matrículas escolares de jovens de idade inferior a 15 anos atingiram recordes (se é que as matrículas significam alguma coisa).
Todavia, 40% da população do mundo vive com menos de 4 reais por dia. No Brasil, 13,8 milhões de famílias sobrevivem com renda mensal de 70 reais mensais (e apoiam o governo, porque nem isso possuíam). O governo não consegue localizar, neste mundaréu de Deus, 700 mil famílias que nem Bolsa-Família têm. Esses brasileiros dos 70 reais vivem com menos do que o necessário segundo o Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde, que fixa o parâmetro de R$ 103,00 mensais.
Houve, também, progressos em nossa terra, do ano 2.000 para cá, se não somos iludidos pelas aparências: o analfabetismo caiu de 13,6% para 9,6%, embora 75% de nossos compatriotas continuem analfabetos funcionais; a mortalidade infantil caiu de 21,3% de crianças nascidas com vida, entre 10 mil, para 13,6%.
Entretanto, o saneamento básico continua a gerar doenças e má qualidade de vida, e nos envergonha até em comparativos no próprio continente: avançamos, de modo pífio, de 61,9% das residências para 65,1%.
Agora, enfrentamos um surto de dengue hemorrágica, no litoral do estado mais avançado da federação, em que muitos municípios já reconheceram formalmente o estado de epidemia; coisa, como se diria algumas décadas atrás, de uma Uganda qualquer. Nesse contexto, o que não deixa de causar espécie é a mutação funcional da Presidente, num país rigorosamente presidencialista e que se rege – inconstitucionalmente – por medidas provisórias, ao deixar o comando da administração federal para subir aos palanques há mais de um ano de sua sonhada reeleição, na companhia de seu patrono e, novamente, ligando o interruptor das luzes da brevíssima panacéia que tudo solucionará – a exploração das imensas riquezas do pré-sal. A maio ria, em que pese a manipulação da realidade na última eleição, talvez continue a lhe dar credibilidade.
O fenômeno, como visto, não é exclusivamente nacional. Atinge uma imensidão de países e conserva o drama da raça humana, que, no século passado, imaginávamos candidamente estar debelado, pelo menos, após 2001 e o explendor da humanidade com sua odisseia no espaço.
*Amadeu Roberto Garrido de Paula é advogado