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Opinião

Só o anarquismo dará respostas

O telefone celular é um destruidor de lares. Se ele não existisse os amigos e casais viveriam em paz. Quantos rompimentos amorosos já ocorreram, ocorrem e ocorrerão por causa dele? É incrível que até hoje ninguém nunca tenha pesquisado a fundo este tema candente do mundo moderno. Me digam: quantas confusões vocês já enfrentaram por causa do mal funcionamento de um celular? Quantas vezes, ao receber a informação de que o celular está fora de área (quando, na verdade, encontra-se num "ponto cego"), ou ainda a chamada não se completa ou – mais grave – o aparelho fica sem bateria, a coisa vira ofensa pessoal e, assim, inimizades florescem como ervas daninhas para sempre?

Conheço gente que se divorciou por causa de uma queda repentina numa ligação rotineira. "Você desligou o telefone na minha cara!?", começou assim a discussão do casal em casa, aos berros. Depois das baixarias e sopapos, tudo terminou na delegacia de Polícia, para o abalo dos familiares e incompreensão de juízes e advogados.


Ficou pior recentemente com o envio de torpedos, e-mails, e outros badulaques, sobretudo quando o usuário (é assim que somos chamados), na ansiedade de responder mensagens, reenvia-as, por engano, com palavras que jamais deveriam ter sido escritas. Tradução: mais brigas, confusões, mágoas, ressentimentos etc, etc, etc.


Bons tempos aqueles em que a única maneira de se comunicar com a (o) amada(o) era através de carta perfumada, entregue nas mãos de um lacaio, demorando dias para chegar e ser respondida. Creio que isso era o que sustentava o amor romântico e que dava substância aos sedutores. Entre a saída e a chegada de um bilhetinho criava-se um mundo especial, onde tudo era belo e lírico. O tempo de espera era preenchido com fantasias translúcidas gerando obras artísticas que permanecem até hoje sólidas como as catedrais do Vaticano.


Agora, basta uma interferência nas transmissões dessas torres esquisitas para que o caos se estabeleça. Tenho saudades dos pombos correios. O único problema era o bichinho ser abatido no meio do caminho, mas essa possibilidade dependia de habilidosos atiradores, algo raríssimo nos dias que correm. Os celulares são um retrocesso na história das relações intercomunicativa dos seres humanos. Anotem essa profecia: eles ainda serão responsáveis pela implantação da barbárie no mundo; voltaremos à idade das pedras. Vamos nos digladiar com paus e porretes. Registrem isso e depois não reclamem.


Acompanhei com grande interesse a visita do Papa Francisco ao Brasil na semana passada. Por causa da mania que tenho de sempre acompanhar o telejornalismo olhando seu entorno (presto atenção nos papagaios de pirata), sempre ignorando quem está no primeiro plano, pude constatar que a entourage papal não usava celulares, pelos menos nos eventos solenes. Isso é sinal de grande respeito e educação, pois não há nada que simbolize a vulgaridade dos tempos modernos do que gente falando alto em locais públicos nos seus iphones.


Da mesma forma, não vi o pessoal do Black Bloc usando celulares nas manifestações que protagonizam. Observem que uma instituição milenar como a igreja procura ser discreta no uso do aparelho e o pessoal da vanguarda da atual maluquice ideológica não deixa rastro usando celulares ( só fotografam e filmam), pois eles sabem que a tecnologia americana rastreia todos esses aparelhos via satélite. Notem: o arcaísmo da igreja e o modernismo do anarquismo sabem que estão fazendo. Ambos representam o nosso futuro. Será que seríamos mais felizes se os celulares desaparecessem? Daqui a cem anos teremos a resposta.


*Dante Filho jornalista e escritor ([email protected])