Antes do segundo dia de julgamento do assassinato do estudante Matheus Xavier, o presidente da Segunda Vara do Tribunal do Júri, Aluizio Pereira dos Santos, disse que talvez não desse para concluir os trabalhos marcado para essa terça-feira (18), tendo em vista que seriam ouvidos 7 testemunhas, uma de acusação e 6 de defesa. Mas com o cancelamento do depoimento de duas testemunhas, o julgamento mais aguardado da década terminará na quarta-feira (19).
Os trabalhos no Fórum Heitor Medeiros começaram por cerca das 8h. O primeiro a depor foi o delegado do GARRAS, Paulo Sartori, testemunha de acusação que conseguiu depor ontem. O depoimento durou cerca de 1h30min.
Logo após foi chamado para depor o advogado Silvano Gomes, uma das duas testemunhas arroladas pela defesa de Jamil Name Filho. Silvano foi advogado da família Name na área cível até 2017. O depoimento do advogado foi rápido, durando apenas 10 minutos. Após o término, a defesa de Name Filho desistiu do depoimento do psiquiatra Leonardo Fabrício Gomes.
Após o anúncio da retirada do depoimento, a defesa de Marcelo Rios comunicou que desistira do depoimento do ex-policial militar do estado do Rio de Janeiro Orlando de Oliveira Araújo. Orlando é acusado de ser chefe de milícia no Rio de Janeiro e é acusado também de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora carioca, Marielle Franco.
A única testemunha que depôs para Marcelo Rios foi sua ex-esposa, Eliane Benites Batalha. Eliane contou que foi coagida a depor no GARRAS. Durante o depoimento, Eliane se emocionou, assim como o réu Marcelo Rios. Foi a primeira demonstração de emoção de qualquer um dos réus nesses dois dias de julgamento. Após o depoimento, Marcelo foi autorizado a rever seus filhos por um breve momento.
Os depoimentos da defesa de Vladenilson Omedo foram prestados por Wagner Louro da Rocha, cunhado de Vlad, e Mário César Velasques Ali.
Com término das testemunhas de defesa, os réus começaram a ser ouvidos no Plenário do Tribunal do Júri. O primeiro réu ouvidos foi o ex-policial civil Vladenilson Omedo. Vladenilson confirmou que começou a trabalhar pro Jamil Name em 2014, na empresa Pantanal CAP, e fazia serviços bancários e gerais. Vlade trabalhou por cerca de 3 anos com os Name, dois anos após sair da empresa, Vlade voltou a trabalhar na casa da família Name. Vlade negou envolvimento com o crime.
Logo em seguida começou o depoimento do ex-guarda civil Marcelo Rios. Marcelo está respondendo um processo por pornografia infantil, e ao ser questionado pelo juiz Aluizio Pereira, Rios se defendeu dizendo que era um péssimo pai e que as fotos eram dos próprios filhos enviados pela mãe para mostrar a rotina dos próprios.
Rios que é formado em direito e tem três pós-graduações, admitiu que recebeu R$ 2 mil para guardar as armas do suposto pistoleiro do grupo organizado, Juanil. Por ter acesso a uma casa da família Name que não era utilizada, Rios guardou o arsenal na casa da família Name, no Monte Líbano. O réu terminou o depoimento dizendo que foi torturado pelo delegado Peró, no Garras e disse que não tinha nenhum envolvimento com o assassinato do estudante.
Por volta das 18:40, Jamil Name Filho começou a depor no Fórum da capital. Ao sentar para depor, Name Filho agradeceu por estar de volta à sua terra natal após quatro anos. Ao ter oportunidade de contar sobre sua vida, o réu começou falando sobre a origem da família no estado e chorou ao comentar sobre o pai que faleceu em decorrência da COVID-19 em junho de 2021, na penitenciária federal de Mossoró.
O júri tem expectativa de terminar amanhã às 16h.
ENTENDA O CASO:
Matheus Xavier foi assassinado na frente da sua casa no dia 9 de abril de 2019, com ao menos sete tiros do fuzil AK-47. A investigação policial acredita que o verdadeiro alvo da milícia era o pai de Matheus, o ex-capitão da Polícia Militar, Paulo Roberto Teixeira Xavier, que era desafeto da família Name por conta de negociações de fazendas que pertenceram ao reverendo Moon.
Para cometer o crime, o grupo contratou Eurico Mota para rastrear a rotina do ex-militar. No entanto, Eurico “terceirizou” o serviço, contratando um hacker para a função. Por volta das 18 horas no dia do crime, Matheus pegou a caminhonete do pai para sair e foi fuzilado pelos pistoleiros da milicia, Juanil Miranda Lima e por José Moreira Freires, o “Zezinho” (Morto pela polícia civil do Rio Grande do Norte em 2020), o fuzil utilizado no crime nunca foi encontrado.
OPERAÇÃO OMERTÀ:
A Operação Omertà foi deflagrada cinco meses após o assassinato do estudante, pelo Ministério Público de Mato Grosso do Sul, por intermédio do GAECO (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) e visou desmantelar o grupo que planejava a maior matança em MS.
A família Name, dona de várias empresas em Mato Grosso do Sul, e envolvida até na política estadual, controlava o Jogo do Bicho na capital, com a “benção” do “Rei da Fronteira”, Fahd Jamil.
A aproximação dos chefes da família, Jamil Name e Fahd Jamil, se deu ainda mais após o desaparecimento do filho de Fahd Jamil, Daniel Alvarez Georges. Para vingar o desaparecimento do filho, os dois grupos se juntaram e execuções com o mesmo padrão começaram a acontecer no estado. A primeira foi do chefe de segurança da assembleia de Mato Grosso do Sul, Ilson Martins Figueireido, em junho de 2018
Em outubro do mesmo ano duas pessoas foram executadas. O Playboy da Mansão” em um bar e, dias após, Orlando Silva Fernandes, ex-segurança do traficante paraguaio, Jorge Raffat, executado com 40 tiros.
Várias execuções, com o mesmo padrão e utilizando armas com grosso calibre, levantaram suspeitas pela polícia. Durante investigação policial, foi descoberto um arsenal de armas na casa do ex-guarda municipal, Marcelo Rios, e com isso o quebra-cabeça para desarticular a maior milícia do MS começou a ser montado. A investigação detalhou que o grupo funcionava em quatro núcleos, tendo a participação de policiais civis, delegado e guardas municipais, com os líderes da milícia sendo Jamil Name e Jamil Name Filho.
Mesmo com a apreensão do arsenal, a polícia não conseguiu encontrar as armas utilizadas nos crimes. Uma teoria é que após as execuções, a milícia transportava as armas para o grupo liderado pelo Fahd Jamil, no lado paraguaio da fronteira, dificultando a localização das armas dos crimes.
A sensação de impunidade do grupo era grande, que durante audiência online, Jamil Name chegou a oferecer R$ 600 milhões para ser transferido para Campo Grande.