Uma prática nova pode passar a fazer parte da rotina dos magistrados que atuam nas varas criminais do país. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) publicou no final de 2008 a Recomendação nº 20 que, dentre as exposições, solicita que os juízes incluam prazo de validade em mandados de prisão, com o objetivo de evitar prisões preventivas não mais necessárias ou prisões definitivas, em virtude de condenação, após o escoamento do prazo prescricional. Além disso, a recomendação também estabelece que o judiciário reexamine os mandados de prisão já expedidos, para que sejam retirados dos cadastros e sistemas dos órgãos de segurança pública aqueles mandados que eventualmente não sejam mais necessários, em razão da perda dos pressupostos da prisão cautelar, ou não sejam mais viáveis, em razão da prescrição da pretensão punitiva do Estado.
Segundo o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ministro Gilmar Mendes, que também preside o CNJ, há pessoas que estão presas há mais de três anos, “apenas com base em um inquérito”, o que, conforme ele, é irregular. O Código de Processo Penal (CPP) estabelece, no artigo 10, que o inquérito deve terminar no prazo máximo de 10 dias se o indiciado tiver sido preso em flagrante ou se estiver preso preventivamente. O mesmo código determina, no artigo 46, o prazo de cinco dias para o oferecimento da denúncia, estando o réu preso.
Da mesma forma, outras regras processuais penais prevêem limites para a realização dos demais atos, impondo, em tese, prazo globalmente considerado, que era – antes da Reforma do CPP – de 81 dias para a instrução processual, prazo esse que não é rígido, uma vez que a jurisprudência admite a extrapolação desse prazo em razão de diversos incidentes, como a expedição de precatórias, a realização de diligências, perícias etc. Após a reforma da Lei 11.719/08 tal prazo foi ampliado, alcançando ao menos 115 dias, podendo ser maior segundo a corrente doutrinária adotada, ainda sem contar o tempo em cartório, as diligências e outros incidentes eventualmente necessários.
Dr. Alexandre Tsuyoshi Ito, juiz titular da 1ª Vara Cível e Criminal da Comarca de Mundo Novo, avalia, num primeiro momento, que a medida é válida, pois evita a existência de inúmeros mandados de prisão em aberto no sistema, até mesmo de processos arquivados. O que dificulta, para ele, é estabelecer um prazo de validade, porque diversos aspectos e peculiaridades devem ser levados em consideração, o que torna bastante complexo estabelecer um parâmetro em termos de tempo de validade, o que só seria possível com uma análise mais detalhada do caráter da ocorrência em questão.
Todavia, Dr. Alexandre salienta que, no seu entender, parece um procedimento que facilita até mesmo possíveis constrangimentos em casos nos quais transcorridos muitos anos, um indivíduo se vê numa situação na qual uma consulta ao sistema aponta a existência de um mandado em aberto de uma questão já prescrita ou que foi solucionada há tempos, no entanto o embaraço de alguém diante desta situação permanece, assim como de quem está com pendências financeiras com um banco, exemplifica o magistrado. Caso o mandado tivesse um prazo de validade, ele, então, seria encerrado no sistema e não deixaria brechas para tal circunstância.
Para o juiz substituto da 1ª Vara Criminal da Comarca de Corumbá, Marcus Abreu de Magalhães, a medida é útil em casos de prisões cautelares determinadas após a citação, como a prisão preventiva, por exemplo, utilizada principalmente para garantir a ordem pública e proteger o processo, impedindo que o acusado prejudique a investigação, e, no caso, em especial, para assegurar o cumprimento da lei penal e aplicação de eventual pena, visto que se trata de foragido.
O magistrado, de agora em diante, pretende adotar o prazo de seis meses para a validade dos mandados de prisão em circunstâncias como as apontadas acima, isto porque acredita que seja um período de tempo razoável para o deslinde do feito e eventual expedição de mandado de prisão definitivo, o qual também terá prazo de validade, agora determinado pela prescrição da pena aplicada.
Dessa forma, Marcus Magalhães atenta para o fato de que a recomendação do CNJ tem menor utilidade em casos de suspensão do processo após a citação por edital, pois não há incidência de prazo prescricional. A recomendação, todavia, ressalta o juiz, torna-se muito útil em casos como de mandados de prisão que levam um certo tempo para serem cumpridos, seja por dificuldades de localizar a parte, seja pelo desaparecimento dos motivos ensejadores da prisão, como o término da instrução, a oitiva das testemunhas ameaçadas entre outras razões pelas quais a medida possa ter perdido o sentido de existir.
A própria recomendação do CNJ considera a existência de inúmeros mandados de prisão pendentes de cumprimento em relação aos quais a pena encontra-se prescrita ou não mais se justifica a privação da liberdade. Com a prática de determinar um prazo de validade para estes mandados, o problema poderia ser reduzido drasticamente. Além disso, a recomendação atenta para que os tribunais proporcionem maior intercâmbio de experiências no âmbito da execução penal, a adoção de processo eletrônico, a estruturação e a regionalização das varas de execuções penais. Essas medidas poderiam, de certa forma, melhorar a comunicação e a racionalização dos procedimentos.