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Certezas e dúvidas em Campo Grande

Lá atrás, bem no início do atual processo eleitoral, havia várias certezas e poucas dúvidas.

Lá atrás, bem no início do atual processo eleitoral, havia várias certezas e poucas dúvidas. A primeira delas é que a candidatura de Edson Giroto (PMDB) poderia ser vitoriosa no primeiro turno em Campo Grande.

Os dados objetivos lhe eram favoráveis: tempo de sobra no horário eleitoral gratuito, apoio do governador Puccinelli e do prefeito Nelson Trad Filho (com respectivas administrações bem avaliadas), recursos disponíveis, adversários fragilizados, enfim, elementos que dão a qualquer campanha  margem segura para vencer com amplo apoio da maioria dos eleitores.

Claro, há o imponderável, mas quem conta com vantagens objetivas tão relevantes certamente elabora estratégias que garantem o sucesso da empreitada, mesmo que surjam adversidades aqui e ali.
Assim, o processo foi-se adensando. Com base em avaliações consolidadas provenientes de pesquisas, palpites, sensações, havia seguidas confirmações das certezas governistas e negação das dúvidas geradas pela coalização oposicionista, tendo em Alcides Bernal (PP), Reinaldo Azambuja (PSDB) e Vander Loubet (PT) apenas a vontade comum de fracionar o eleitorado e levar a eleição ao segundo turno.

A hipótese era improvável. Só a soma de muitos erros (com excesso de arrogância, dissidência interna, traições pontuais, marketing mal feito, políticas negativas,  atitudes erráticas de protagonistas do processo e leituras equivocadas das demandas da sociedade) poderia levar a resultados adversos da candidatura de Giroto.
 
Foi o que aconteceu. O resultado final desnorteou toda a gama de certezas governistas e agora coloca só dúvidas no processo de escolha do futuro prefeito da Capital. A realização do segundo turno em Campo Grande – fato novo na nossa política – entre Alcides Bernal ( que ganhou dianteira tranquila com mais de 40% dos votos válidos) e Giroto ( que teve 27%, mas quase ficou de fora pelo crescimento surpreendente de Azambuja, que fechou com mais de 25% de preferência), abre um grande dilema: optar por algo que tem jeitão de aventureirismo (guardadas as diferenças, do tipo Ari Artuzzi, em tempos passados em Dourados) ou escolher um continuísmo que deu demonstrações de não ter compreendido a nova realidade política que vem se desenhando na cidade e talvez no País.
 
Na contabilização dos erros, entre muitas coisas, ficou claro que o PMDB não vence em Campo Grande sem estar umbilicalmente unido ao PSDB/PPS. A escolha do vice de Giroto, o ex-deputado Dagoberto Nogueira, não foi, decididamente, um acerto político; a mão pesada de Puccinelli, que antes tinha até um viés folclórico e engraçado, cansou. Acho que o governador deve compreender com a máxima generosidade possível que o tempo do "manda quem pode, obedece quem tem juízo" já terminou há mais de 15 anos. A influência política do prefeito Nelson Trad Filho na cidade é pífia. As avaliações dos institutos de pesquisa sobre sua gestão devem ser reavaliadas, pois é mais do que evidente que ele é uma figura com intensos desgastes políticos e pessoais.
 
Diante disso, o caso de Alcides Bernal surge quase como uma narrativa romanesca de Gabriel Garcia Marques: todos sabem que vai dar errado caso ele seja eleito, mas a força do autoengano é tamanha que se prefere pagar para ver do que dar o braço a torcer para o esquema hegemônico criado por Puccinelli e pelo PMDB. A cidade pagará um preço caro por isso, mas o que se há de fazer quando a eleição se torna um processo de vingança contra tiranos imaginários?
 
Notem: neste segundo turno, no programa eleitoral da TV, Bernal tenta não se mexer muito, não criar marola, com a ideia fixa de que se passar batido, sem que se levante suspeita sobre o vazio penetrante de suas "propostas",  ele vence a eleição por inércia. Giroto optou por fazer longas entrevistas, mostrando-se um candidato com personalidade própria. No limite, ele parece estar fazendo sessões de psicanálise para encontrar o seu eixo. Vai dar certo? Não se sabe.
 
Agora, as certezas e as dúvidas se amalgamam numa fumaça densa que coloca o eleitor no meio do nada. Numericamente, Bernal tem mais chances de ser eleito. Giroto só tem um caminho: politizar o debate e desconstruir de maneira convincente seu adversário. Dará tempo? Nesse caso, só há uma resposta: tudo é possível no mundo das impossibilidades sonhadas.

(*) Dante Filho é jornalista ([email protected])