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De Lula a Che Guevara, arquivos descobertos em Santos detalham espionagem do Dops

Documentos achados por acaso mostram que 45 mil pessoas foram investigadas

Descobertos por acaso depois de 25 anos esquecidos nos fundos do Palácio da Polícia da cidade de Santos (SP), os arquivos do Dops (Departamento de Ordem Política e Social) revelam a história de espionagem contra 45 mil pessoas – principalmente durante o regime militar – que, enquanto estiveram pelo litoral de São Paulo, tiveram seus passos datilografados em 11.600 prontuários.

O historiador e coordenador do Arquivo Público do Estado, Carlos Bacellar, falou ao R7 do trabalho de recuperar esse material, encontrado nos fundos do Palácio da Polícia santista.

– Os documentos foram tratados no último ano. Tiramos toda a sujeira acumulada ao longo de décadas, tiramos os vestígios de inseto para não contaminar o resto do acervo e estamos colocando uma parte dele à disposição da população.

As fichas contam parte da história de investigação de desconhecidos e ilustres opositores da ditadura militar (1964-1985), como o relato mensal sobre Carlos Lamarca, um dos líderes da luta armada no país, entre 1969 e 1971.

No relatório do dia 1º de setembro de 1969, os policiais falam em como seu grupo conseguiu roubar R$ 4,2 milhões (US$ 2,5 milhões) que pertenciam ao ex-governador de São Paulo, Adhemar de Barros, mas que ficaram com sua secretária após sua morte.

Os militares dizem que a ação foi descrita assim pelo próprio Lamarca: “… após demorada investigação, apuramos o lugar em que se encontrava a caixinha do ex-governador de São Paulo Adhemar de Barros”.

Já o relatório 353 do dia 15 de outubro de 1969 de outro ilustre comunista e líder da luta armada, Carlos Menezes Marighella, diz que “pessoa ligada ao comunismo comenta que o sequestro do embaixador americano Charles Burke Elbrick [em 1969] não teve a total aprovação de Carlos Marighella e já está havendo divergência no seio de seu próprio grupo”.

O texto de nove linhas diz que ele estaria tentando unir as alas dissidentes do PCB desde que iniciasse “desde logo a verdadeira luta revolucionária”.

Mas o maior arquivo foi reservado ao lendário Luís Carlos Prestes: duas páginas que contam até como a polícia seguiu seu “auto marca Fiat, cor branca, placa EQ 2607, de Goiás, ano de fabricação 1980” pelas ruas de Santos.

A ficha do então sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva traz uma novidade, segundo a cientista política da Ufscar (Universidade Federal de São Carlos) Maria do Socorro, os policiais transcreveram um discurso do petista dizendo que barrou a entrada de Prestes no PT.

– Não havia histórico de declaração de Prestes dizendo que ele queria entrar no PT. A tendência de quem foi do Partidão [o PCB] era ficar dentro do PMDB para chegar ao poder utilizando sua estrutura partidária, já espalhada por todo o Brasil.

Até o ex-jogador Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, e o guerrilheiro argentino Che Guevara tinham suas pastas. Na de Pelé, recortes de jornal relatam o disparo de revólver que estilhaçou a janela de sua sala de troféus às 19h15 do dia 8 de dezembro de 1973. Na ficha do revolucionário, há o seguinte texto do dia 9 de agosto de 1966.

“Consta que Che Guevara estaria para entrar no Brasil e que foi visto em países limítrofes na faixa entre Uruguai e Paraguai. Se realmente identificado, solicita-se a prisão imediata.”