Mais de duas décadas depois de "ligar" fisicamente Centro-Oeste e Sudeste, por meio de uma obra de engenharia até hoje moderna e pouco comparada ao redor do mundo, a ponte rodoferroviária sobre o rio Paraná pode ser considerada esquecida. Sem manutenção, a ponte oferece riscos a motoristas trafegam entre Rubinéia (SP) e Aparecida do Taboado (MS) não apenas pela falta de iluminação, mas manutenção insuficiente também em sua estrutura.
A ponte, construída em 1998 com recursos da União e custo próximo de R$ 800 milhões, foi “dividida” para sua exploração comercial. A parte ferroviária ficou com a iniciativa privada, por concessão, e a parte rodoviária com o Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), órgão do governo federal com a função de manter rodovias, ferrovias e hidrovias.
Em 2014, após manifestação de interesse pelo governo de Mato Grosso do Sul, o Dnit – mesmo já responsável pela conservação do trecho – assinou um convênio de delegação à iniciativa privada para a manutenção da obra. A justificativa foi considerada falha pelo Ministério Público Federal porque o próprio órgão relatou ter investido R$ 3,5 milhões entre 2009 e 2014, na conservação e segurança das instalações e equipamentos elétricos da ponte.
Neste mesmo ano, uma decisão cautelar suspendeu a licitação que escolheria a empresa responsável por explorar o pedágio na ponte rodoferroviária. Não constava no convênio, por exemplo, informação que justificasse uma tarifa de R$2,50. Desde então, o governo de Mato Grosso do Sul assumiu a manutenção da ponte, quando o governo federal delegou ao Estado a exploração do trecho de rodovia BR-158, que faz a ligação rodoviária com o Estado de São Paulo.
Na época o governo sul-mato-grossense anunciou que abriria licitação para concessão da ponte por 20 anos e que isso resultaria na cobrança de pedágio. Contudo, manifestações contrárias à iniciativa, e a troca de governo, tiraram a ponte da pauta.
ABANDONO
Hoje, há necessidade de recuperação do pavimento, sinalização, limpeza, segurança e iluminação. Toda a rede de cabos de eletricidade que abasteciam a ponte foi furtada e há postes sem lâmpadas, com hastes soltas, em risco direto a motoristas. Há também muitos buracos no asfalto, a sinalização é precária em placas e na pintura de faixas. Em toda a extensão da ponte há lixo, vegetação crescendo e invadindo a pista. Peças de veículos e outros objetos caídos na pista são comuns.
Quem trefega pela ponte nota a situação de abandono. Veja imagens na galeria desta reportagem.
A OBRA
A obra possui 3,7 mil metros de comprimento e é a maior ponte fluvial brasileira, construída com tecnologia holandesa.
Os ventos fortes que chegavam a 75 nós e ondas de até dois metros de altura foram algumas dificuldades encontradas na execução da obra pela empreiteira Constran. Outro aspecto relevante foram as variações de profundidades com relação ao relevo do rio, além de rochas basálticas extremamente resistentes às perfurações, além do intenso tráfego de balsas que faziam o transporte entre os dois Estados.
Durante a construção foi utilizado pela primeira vez um sistema de alerta de tempestades específico para uma obra fluvial. Com este monitoramento, não houve vítimas, mesmo com intensas tempestades que ocorreram na época.
Foi a primeira ponte construída no Brasil com os sistemas ferroviário e rodoviário sobrepostos, em um trecho de 2,6 mil metros de estrutura metálica, tendo a existência de dois viadutos de acesso em concreto. Em toda a construção foram consumidos 64 mil metros cúbicos de concreto, sendo 25 mil m³ destinados apenas à execução da fundação, constituída por tubulões com até 55 metros de coluna d’água. A pista rodoviária possui quatro faixas de rolamento.
O OUTRO LADO
Em nota enviada à reportagem, nesta semana, a Seinfra (Secretaria estadual de Infraestrutura), pasta responsável pela manutenção de rodovias em Mato Grosso do Sul, anunciou que prevê a recuperação de partes degradadas da ponte, no mês de junho. Cita que estão previstas a troca de placas e a sinalização das pistas, além de outros itens de manutenção.
A nota não cita, porém, se o governo pretende retomar a ideia de repassar a ponte à iniciativa privada.
O Dnit informou que não tem mais domínio sobre a obra e que a parte ferroviária está concedida à empresa ALL Rumo. A reportagem não identificou problemas de manutenção nos trilhos e na estrutura interna da ponte, com a passagem de trens de carga, pelo local, em média de três composições por dia.
A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), responsável pela manutenção da ponte), não respondeu a pedido de informações.
A Secretaria estadual de Transportes de São Paulo não informou sobre manutenção nem se estuda instalar um posto policial na rodovia Euclides da Cunha (SP-320), como definido com a ANTT em 2014. Também não há base policial no trecho da BR-158, do governo federal. (Colaborou Valdecir Cremon)
A HISTÓRIA
A construção da ponte foi defendida por Euclides da Cunha, em 1901. Meio século depois, a obra foi incluída para debates na Conferência dos Governadores da Bacia Paraná-Uruguai. Mas, a inauguração ocorreu em 29 de maio de 1998, após investimento dividido pelos governos federal e de São Paulo.
A obra possibilitou a conclusão da ferrovia Ferronorte, que liga a malha ferroviária de São Paulo à cidade de Alto Taquari (MT), permitindo o escoamento da produção de grãos de parte do Centro-Oeste.
A parte rodoviária da ponte leva o nome do ex-deputado Roberto Rollemberg e a ferroviária, o do ex-senador Vicente Vuolo, ambos falecidos. Os dois tiveram papel destacado no esforço pela construção da ponte, dentro de um projeto mais amplo que já previa a extensão da ferrovia a Cuiabá (MT) e depois a Santarém (PA). Na época, em parecer favorável ao projeto, o relator, senador Juvêncio da Fonseca (PMDB-MS), classificou Vuolo e Rollemberg como "batalhadores incansáveis" pela integração entre as duas regiões.
IMAGENS
>>> Veja mais fotos da ponte na galeria desta reportagem.
>>> Assista reportagem especial sobre a ponte, nesta segunda-feira (3), no telejornal "RCN Notícias", da TVC HD – Canal 13.1, às 6h30.