O governo deve encaminhar até o final de abril deste ano um projeto de lei regulamentando o direito de acesso a informações públicas no país. O anuncio do prazo foi feito pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, durante o Fórum do Direito de Acesso a Informações Públicas, realizado em Brasília, nos dias 1º e 2 de abril.
"Vamos estabelecer um marco na regulação do acesso a informações e vamos excluir qualquer processo do sigilo quando se tratar de violação dos direitos humanos", disse a ministra. A data do anuncio feito pela ministra coincidiu com os 45 anos do golpe militar de 1964.
Além dos dados referentes à administração pública em geral – como dados do orçamento e do judiciário -, a lei deve facilitar a busca pelos arquivos do SNI (Serviço Nacional de Inteligência), do CSN (Conselho de Segurança Nacional), da CGI (Comissão Geral de Informações) e do Arquivo Nacional.
Esses órgãos guardam arquivos ainda inéditos sobre a ditadura militar. Eles vêm sendo abertos nos últimos anos. Como não há um procedimento específico para o acesso aos documentos sigilosos, há dificuldade em obtê-los. O resultado tem sido a divulgação, a conta gotas, de trechos desses arquivos em jornais e revistas.
Caso a lei seja aprovada, o procedimento para obter esses documentos seria regulamentado.
O projeto é fruto de entendimentos e discussões entre setores da sociedade civil com o Ministério da Casa Civil e a Corregedoria Geral da União.
A lei deve, assim, regulamentar o acesso de qualquer cidadão a informações públicas, direito previsto no inciso 33 do artigo 5º da Constituição de 1988. O artigo diz que "todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei".
Como a lei prevista pela Constituição ainda não existe, há dificuldades na busca de documentos por cidadãos. Até agora o direito previsto na Constituição era normatizado somente por meio de um decreto. "Uma lei é necessária para especificar os detalhes desse processo. O que o artigo da Constituição significa? O que é necessário responder ao cidadão?", disse o canadense Toby Mandel, um dos organizadores do fórum.
A existência da lei daria a possibilidade de o cidadão ter acesso a relatórios, relações de cargos e orçamentos e detalhes de processos decisórios de instituições públicas.
O acesso não seria irrestrito. Há consenso em torno da necessidade de exceções às regras de transparência. Toby citou como exemplo matérias relativas à vida privada, como declarações de impostos e de saúde de cidadãos. Divulgá-las feriria o direito à privacidade. Informações geológicas também deveriam ficar restritas.
Projeto ainda está sendo elaborado
O anteprojeto da Casa Civil ainda não foi concluído. Dilma evitou falar de detalhes do seu teor, pois eles ainda podem ser modificados. Apesar do teor inteiro do projeto não ser confirmado, já há pontos polêmicos, que devem ser motivo de discussão no Congresso.
Um deles é a forma como serão regulados os órgãos públicos de Estados e municípios. Segundo Claudio Weber Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, as instituições mais opacas não estão no governo federal, mas nos Estado e municípios. Para regulá-los, seria necessário uma legislação não restrita à União e que também não venha a ferir a autonomia deles.
A existência de uma agência reguladora também será alvo de debate. Em diversos exemplos de outros países, como o México, existe um órgão específico para tratar do acesso a informação. Isso evitaria a necessidade de se recorrer ao Judiciário quando houver problemas no processo. Poupando a Justiça, poderia haver economia de tempo e dinheiro.
Alguns dos congressistas presentes no evento refutaram a necessidade de uma agência reguladora. Um deles foi o senador Aloizio Mercadante (PT-SP). Ele acredita que uma agência criaria uma nova burocracia, onde haveria mais funcionários indicados em consequência de disputas políticas.
Leis sobre o assunto já existem em diversos países
Mais de 80 países em todo o mundo já têm leis sobre o assunto. Entre eles, estão até regimes ditatoriais, como o chinês. Recentemente, o Chile e o México fizeram sua regulação.
Em sua fala no evento, a ministra Dilma admitiu que o Brasil está atrás de outros países. Mas, segundo ela, isso pode se tornar uma vantagem se o país conseguir se beneficiar das experiências concretas.