O vereador Jorginho do Gás, presidente da Câmara de Três Lagoas, ajuizou ação cautelar tendo o Grupo RCN de Comunicação requerido, visando obter gravação de programa do RCN Notícias, sob a alegação hipotética de que teria sido ofendido e caluniado durante o programa que vai ao ar de segunda feira a sexta-feira, entre às 7h e 9h, apresentado por Ana Cristina Santos, alegando que esta e os ouvintes ouvidos pelo programa teriam cometido excessos, injúria, calúnia e difamação.
Em verdade, apenas externaram única e exclusivamente suas opiniões quanto aos gastos escandalosos com diárias pagas a vários vereadores em valores considerados elevados para fazerem viagens à Campo Grande e para fora do Estado, além de vários outros gastos considerados complementares aos subsídios de pouco mais de R$10 mil que recebem, mensalmente.
Em despacho fundamentado, o juiz Márcio Rogério Alves destaca que pelas normas que regem as emissoras de radio e o Código Brasileiro de Telecomunicações, os arquivos, ficam guardados por 60 dias e podem ser conservados por até três anos. Após esse prazo, nada obriga a emissora a apresentar arquivos. Não cabe, portanto, nenhuma medida cautelar para exibição de documentos como pretendia o vereador.
O presidente da Câmara quer identificar “caráter ofensivo” em reportagem que ouviu a opinião do povo, que pode se expressar livremente. Mais adiante, destacou que “não há prova de negativa da emissora em fornecer a gravação. Apenas fora protocolado o pedido e encaminhado ao Departamento Jurídico da empresa, isto ontem (04/09/2014)”, destaca o juiz Márcio Rogério Alves, que cita orientação do Superior Tribunal de Justiça acerca da guarda de arquivos supostamente ofensivo “como requisito” ao ajuizamento de ação indenizatória. “A lesão pode ser demonstrada por outros meios”, observa o magistrado.
Sobre a pressa do vereador em “produzir provas” para processar o Grupo RCN, alegadamente por calúnia, injúria ou difamação, o juiz que negou a liminar para exibição imediata do programa que ouviu a população que condena os excessos na Câmara, lembra que “não há qualquer risco de dano irreparável ou de difícil reparação que demonstre o perigo de demora (periculum in mora)”, até porque o vereador pode ingressar com eventual ação indenizatória até três anos após a divulgação do fato.
Na ação cautelar, a direção da Câmara tenta imputar ao Grupo RCN de Comunicação, por intermédio da emissora de rádio Cultura FM, objetivo escuso ao interesse público, confundindo o papel de informação que cumpre observar. Manifestamente, desconhece o papel dos veículos de comunicação, os quais no mundo moderno exercem a função de porta voz das inquietações sociais, além de terem a obrigação de defender os interesses coletivos.
O Grupo RCN de Comunicação, segundo o seu diretor geral, Rosário Congro Neto, não abre mão de exercer a atribuição de imprensa livre, independentemente de sua relação comercial com os poderes, como mural divulgação dos atos oficiais, avisos e editais, os quais em seus teores, envolvem o interesse público no equacionamento de questões fundamentais que muitas das vezes causam surpresa e aflição àqueles que acompanham atos e fatos ocorridos na administração pública em geral.
Em razão de sua linha editorial, o Grupo RCN de Comunicação, conseguiu com o respaldo do Ministério Público e da Justiça, cobrar eficácia do Portal da Transparência, reduzir a cota de diárias, embora os valores ainda são absurdamente elevados, e regularizar a utilização de veículos pelos vereadores.
“Não enxergamos nenhum objetivo de denigrir a imagem do Poder Legislativo, pelo contrário, busca-se a moralização. Os moradores da cidade, que já conviveram com vereadores em época que a atividade parlamentar era voluntária, sem remuneração, não conseguem entender porque Três Lagoas tem tantos vereadores e a um custo tão alto. Só uma atividade legislativa produtiva, voltada aos interesses coletivos, com leis de alcance social, justifica o custo que recai sobre o poder público que é bancado pelo contribuinte”, diz o diretor geral do Grupo RCN, Rosário Congro Neto.
Vereador diz que Prefeitura é culpada por erros da Câmara
Nenhum erro justifica outro, mas essa máxima não se aplica à Câmara, a jugar pela alegação dada pelo vereador Jorginho do Gás. Segundo ele, a opção por locação ou invés de aquisição de carros levou em conta exemplo da Prefeitura e casos de outros municípios. A reportagem que a Jornal do Povo produziu sobre a “estranha” locação de carros para servir aos vereadores ouviu o presidente da Câmara. Na opinião dele, Três Lagoas tem boa arrecadação e pode gastar bastante com locação de veículo, embora a alegada gorda receita não tem se refletido em melhorias e progresso urbano e social.
“Não somos a única Cidade que loca carro. Não adianta questionar esse fato, pois isso está previsto em Lei. Nosso papel, enquanto vereador, é fiscalizar se os contratos estão dentro das normas. Uma cidade que arrecada tanto, como é o caso de Três Lagoas, não tem nada de anormal gastar cerca de R$ 300 mil, por mês, com locação de veículos”, alegou à época o vereador, que iniciou sua gestão na direção da Casa adotando procedimentos estranhos, como a terceirização de assessores de imprensa e operações com prestadores de serviço, utilizando a modalidade de contratação de trabalho de um considerável número de servidores em funções gratificadas. A julgar pela opinião popular, o enxugamento das despesas promovido nas duas últimas legislaturas, por conta da cobrança da imprensa, ainda não é o ideal. As verbas indenizatórias são vistas como “escárnio” do dinheiro público.
Escárnio
A Câmara de Três Lagoas gastou no ano passado quase meio milhão de reais com verba de cota extra que autoriza determinados despesas para o exercício da atividade parlamentar. Juntos, os 17 vereadores gastaram de fevereiro a dezembro de 2013, R$ 495 mil com indenizações e restituições de despesas com diárias de viagens, combustível, aluguel de carros, material de escritório, telefone, entre outras. Esses são considerados extras aos subsídios que cada vereador recebe mensalmente no valor de R$ 10.041,00.
No ano passado, a Câmara de Três Lagoas gastou R$ 12 milhões, ou seja, todo o duodécimo destinado pelo Poder Executivo ao Legislativo Municipal, por determinação de lei. Por ano, somente com subsídio, cada vereador recebeu R$ 120.492,00. Os números equivalem a um gasto anual para o Legislativo de Três Lagoas de R$ 2.048.364,00, somente para o pagamento de subsídios para dezessete vereadores.