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Mário Covas é anistiado pelo governo federal

O processo de Covas, morto em 2001, foi impetrado na Comissão por sua viúva, Florinda Gomes Cova

Passava de sete horas da noite e uma série de processos já havia sido julgada pela 33ª Caravana da Anistia, realizada quinta-feira (04) em São Paulo, quando a comissão reconheceu a perseguição política e declarou anistiado político post mortem o ex-governador paulista Mário Covas.

O processo de Covas, morto em 2001, foi impetrado na Comissão por sua viúva, Florinda Gomes Cova. Covas teve os direitos políticos cassados por dez anos, quando era deputado federal – entre março de 1969 e março de 1979. Como forma de reparação econômica, Florinda Gomes, receberá uma prestação única de 300 salários mínimos – o valor é limitado ao teto de R$ 100 mil. Em todos os casos de parlamentares cassados esta é a indenização concedida pela Comissão de Anistia.

A viúva do ex-governador foi representada na sessão por seu neto Gustavo Covas Lopes. Para ele, o avô era respeitado por todos como um grande homem. Faltava apenas o reconhecimento do Estado brasileiro, o que ocorreu ontem. Ainda segundo ele, “é um orgulho ser neto de um político como o avô, em um país onde político é sinônimo de corrupção”.

Nascido em Santos, o engenheiro Covas iniciou suas atividades estudantis ainda na graduação, na Escola Politécnica na Universidade de São Paulo (USP), em 1955. Foi presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), seccional São Paulo, deputado federal constituinte, senador, prefeito e governador de São Paulo por 2 mandatos, além de um dos fundadores do MDB, partido de oposição ao regime.

Preso em 1969 por motivação política e indiciado em inquérito parlamentar, teve o mandato de deputado federal cassado e os direitos políticos suspensos por dez anos. Voltou a se dedicar à política em 1979, com a anistia. Em 1988, foi um dos fundadores do PSDB. Candidatou-se pelo partido à Presidência da República em 1989, nas primeiras eleições diretas para presidente após o regime militar. Faleceu em 2001 em São Paulo.

Emoção

Se no momento em que Covas foi anistiado a platéia era pequena, pela manhã o auditório do Sindicato estava lotado. Metalúrgicos, sindicalistas, ex-perseguidos políticos e jovens prestigiaram atentos à cerimônia de abertura da caravana. O ato foi marcado pela emoção. A equipe da Comissão de Anistia fez uma homenagem ao ministro da Justiça, Tarso Genro, que deixa o cargo na próxima semana para concorrer ao governo do Rio Grande do Sul. Na seqüência, os anistiandos e anistiados políticos também o homenagearam.

Estiveram presentes o intelectual Antônio Candido; Nita Freire, viúva de Paulo Freire; Lúcia Alencar, irmã de Frei Tito; João Vicente, filho do ex-presidente João Goulart; jornalista Rodolfo Konder; Daniel Seidel, da Comissão de Justiça e Paz da CNBB; deputado Brizola Neto; Carlinhos Marighella, filho de Carlos Marighella; Daniel de Souza, filho de Herbert de Souza, o Betinho; Renato Rabelo, presidente do PCdoB; deputado Paulinho Pereira (PDT) e  o procurador da República Marlon Weichert, além de operários demitidos durante a ditadura, ex-presos políticos e representantes de associações de anistiandos.

Incentivador dos trabalhos da Comissão de Anistia, Tarso assistiu a um vídeo com imagens de todas as 32 caravanas anteriores, editado em sua homenagem. Presidente da Comissão, Paulo Abrão emocionou-se e agradeceu ao ministro pelo apoio nas atividades. “O Brasil sai mais justo após a sua passagem pelo Ministério da Justiça”, “A política, ao seu lado, vale muito a pena”, afirmou o presidente.

A platéia também se emocionou com outros vídeos apresentados, nos quais eram relatadas as histórias de mulheres e homens perseguidos pelo regime militar (1964-1985). Muitos choraram ao rever amigos nas imagens ou se identificar com o que era mostrado. De saída do governo federal, o ministro garantiu que as ações desenvolvidas pela Comissão terão continuidade e não sofrerão qualquer tipo de retrocesso.

Tarso ainda foi homenageado por Clara Charf, viúva do fundador da Aliança Libertadora Nacional (ALN) Carlos Marighela, e pelo ex-militante Ivan Seixas. A atriz Zezé Mota, ícone na luta pela redemocratização do país, foi a mestre de cerimônia do evento. Zezé cantou a música “Senhora Liberdade”, relembrando os versos que entoava nos discursos pela volta das eleições diretas nos anos 1980.

Antônio Cândido, ao fazer uso da palavra na sessão de julgamento de um dos processos afirmou que “Os momentos das caravanas são momentos em que o Brasil se encontra consigo mesmo. E isso acontece quando a aspiração de justiça e liberdade do povo coincide com a ação dos governantes”.

Dois anos

A Caravana da Anistia, projeto educativo da Comissão que julga os casos de perseguição política entre 1946 e 1988 onde eles ocorreram, completará dois anos no próximo mês de abril. A ação, que esteve em todas as regiões do país desde então, teve início na gestão de Genro no Ministério da Justiça.

Dos 55 mil processos protocolados na Comissão desde 2001, cerca de 13 mil ainda serão julgados. Trinta e cinco mil foram deferidos. Destes, em cerca de 11 mil houve algum tipo de reparação econômica.