A professora de língua portuguesa Rita Schettini Costa abriu mão dos livros para concluir que a população leva em média uma década para se adaptar às mudanças ortográficas. Em uma visita ao túmulo dos pais, no cemitério municipal de Muriaé, na Zona da Mata mineira, ela percebeu que a ortografia dos epitáfios se manteve a mesma por um longo período após as reformas da língua portuguesa.
Rita encontrou lápides da década de 1980 onde pôde ler “Êle deixa saudades”, com acento circunflexo. Desde 1971, o pronome havia perdido o acento. No túmulo de uma mulher falecida na década de 1930, a lápide registra que “ella” que deixava saudades para seus filhos e “paes”. “Em alguns casos, a demora para se adotar as novas normas de ortografia chegou a passar de 20 anos”, diz Rita.
O trabalho virou a pesquisa do aluno Adalberto da Silva Alves, de 29 anos, na Faculdade Santa Marcelina. Além do cemitério de Muriaé, ele estudou as lápides da cidade vizinha, Patrocínio de Muriaé, e encontrou a consoante “l” dobrada, como em “Orae por Elle”, de 1938 – sete anos após a primeira grande alteração feita na língua portuguesa com consenso entre Brasil e Portugal. A mesma reforma foi revogada em 1934 pela terceira Constituição brasileira, mas Getúlio Vargas voltou atrás quatro anos depois.
Adaptação
Tantas mudanças podem ter influído na demora da adaptação às normas ortográficas. Mas Adalberto cita mais uma razão: a pequena parcela da população que tinha acesso à educação. “Em se tratando das primeiras décadas do século passado, o acesso ao material escrito era mais escasso”, diz. Esse motivo levou a professora dele a evitar a biblioteca municipal, onde encontraria obras de autores que conheciam as normas, mas que eram minoria. “O cemitério é como um museu a céu aberto, pois os epitáfios eram escritos pelas próprias famílias”, diz.