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Antibióticos monitorados ainda este ano

Anvisa pretende definir em setembro quais remédios do tipo terão a venda rastreada

Em setembro deste ano, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) prevê já ter escolhido quais antibióticos terão as vendas rastreadas nas farmácias do País.

O critério para a seleção são os remédios do tipo mais dispensados nos pontos de venda e também os que mais apresentam indício de uso abusivo, contraindicado e perigoso por parte da população.

Quatro marcas, que ainda não tiveram os nomes revelados, são cotadas para o monitoramento, que permite saber quais são os médicos que mais prescrevem a droga, além das farmácias que mais venderam sem exigir receita médica.

A decisão pela Agência foi tomada após inúmeras pesquisas científicas constatarem a resistência das bactérias aos tratamentos clínicos disponíveis, o que indica diminuição de opções terapêuticas para vencer doenças como garganta inflamada, infecções severas e meningite. Participam do grupo de discussão sobre a restrição e o monitoramento dos antibióticos médicos, farmacêuticos, dentistas e veterinários.

Para os especialistas, a diminuição do efeito curativo dos remédios desta classe é resultado da venda descontrolada nos balcões, da automedicação e também da prescrição inadequada por parte dos médicos. Segundo eles, não é raro ver pessoas que não fazem o tratamento completo com os antibióticos (todos os dias necessários), guardam a sobra dos comprimidos e usam quando sintomas semelhantes aparecem em outra ocasião. Tudo isso interfere no ciclo e na eficácia do medicamento.

“Estamos em processo de definição da consulta pública e prevemos que, em setembro, já estejam escolhidos quais antibióticos vão entrar para o sistema eletrônico de monitoramento”, afirmou o presidente da Anvisa, Dirceu Raposo de Melo, durante a participação da feira de produtos médicos que ocorreu em São Paulo. “Mas de maneira geral, o que é preciso é um controle mais incisivo de todos os antibióticos vendidos. O comércio descumpre as regras e não exige a receita médica na hora da venda. A OMS (Organização Mundial de Saúde) já alertou sobre a maior dificuldade mundial de tratamentos por causa da resistência das bactérias”, completou.

Os primeiros antibióticos serão monitorados em um projeto piloto. Durante o ano passado, as drogas usadas para emagrecer passaram por processo semelhante. Das farmácias brasileiras, mais de 60% foram monitoradas e juntas venderam 6 toneladas de medicamentos usados para perder peso. Diante das informações, o Conselho Federal de Medicina abriu processos investigativos para apurar se houve comportamento errado por parte dos médicos mais prescritores.

Diagnóstico

O Conselho Regional de Farmácia de São Paulo fez um levantamento com duas mil farmácias e drogarias de São Paulo e constatou que 68% delas vendiam antibióticos sem exigência da apresentação da receita. O vice-presidente da entidade, Marcelo Polacow Bisson, ressaltou que nem todos os estabelecimentos contatavam com a presença de um farmacêutico, o que pode ter interferido no resultado.

Para ele, a situação atual da resistência das bactérias aos tratamentos antibióticos é crítica e o monitoramento das vendas uma ação necessária. “Há dois anos começamos a discutir essa questão. O monitoramento não seria necessário caso houvesse conscientização por parte dos farmacêuticos, médicos e população. Na Holanda, por exemplo, não há controle nem de psicotrópicos, porque não há uso abusivo”, afirmou o vice-presidente.

Bisson também é professor de administração farmacêutica e diz que o maior rigor na venda de antibióticos pode, sim, ter um impacto na economia. “Mas é um debate com cautela, porque a divisão é entre economia e saúde pública”, afirmou.

Dados

Segundo informações da Anvisa, os antibióticos movimentaram no ano passado R$ 1,6 bilhão e dados da OMS já evidenciaram que 50% das prescrições deste medicamento são inadequadas.

O Instituto Adolfo Lutz foi um dos que detectou o possível uso errado dos antibióticos. A pesquisadora Maria Cecília Gorla analisou 1.096 amostras da bactéria causadora da meningite e identificou que, em dois anos, elas ficaram 12,6% mais resistentes à penicilina e ampicilina, dois antibioticos muito usados no tratamento.

O trabalho mostrou que seriam necessárias mais doses para tratar o doente. Os resultados serviram de indício para o uso equivocado e para prescrição inadequada. "Já existem medicamentos mais potentes para o tratamento das infecções, mas se a cultura da automedicação e uso errôneo não mudar, é questão de tempo para as drogas ficarem menos eficazes", afirmou Maria Cecília.