A pesquisa realizada em Três Lagoas, que deu origem ao artigo publicado no periódico Caderno de Saúde Pública, no começo deste ano, revela para um dado mais que alarmante: a cada caso manifestado da leishmaniose, podem haver outros dez assintomáticos em Três Lagoas.
O artigo é assinado por pesquisadores da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Universidade do Rio de Janeiro e Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Segundo informações da Agência de Notícia Fiocruz, na pesquisa, foram acompanhadas 46 famílias três-lagoenses, em que pelo menos um membro havia apresentado manifestações clínicas da doença. Destas, duzentas e vinte pessoas, que não apresentavam sintomas, passaram pelo exame sorológico e o resultado assustou: 36,4% dos familiares haviam sido infectados pelo protozoário, entretanto não manifestaram a leishmaniose.
Caso estejam corretos, os resultados mostram que no ano passado, por exemplo, 480 pessoas possam ter adquirido a leishmaniose, porém não apresentaram sintomas.
De acordo com os pesquisadores, Três Lagoas foi escolhida para a pesquisa por conta do alto índice de infestação do inseto transmissor da doença e pela disseminação rápida da leishmaniose na região. Esta não foi a primeira vez que o Município foi alvo de estudos sobre a doença.
No mesmo artigo, foi verificado ainda que a taxa de casos assintomáticos foi maior entre as famílias que convivem com cães. Outro fator que chamou a atenção foram as declarações dos próprios moradores. A grande maioria informou conviver a presença de insetos com as características do flebótomo nas casas.
A maior preocupação agora é com a influência dos casos assintomáticos no Município. Os pesquisadores concordaram que novas pesquisas serão necessárias para esclarecer o papel que os casos assintomáticos desempenham na transmissão da doença. Mas afirmam que os indivíduos expostos à infecção, ou já infectados pela leishmaniose, e que não apresentaram sintomas, podem se transformarem em reservatórios da doença.
A mesma pesquisa aponta que a incidência da leishmaniose nos casos clássicos (registrados) é maior entre homens e crianças. Já em relação nos assintomáticos, não há diferença entre sexo e idade.
INSUFICIENTE
A secretária municipal de Saúde, Elenir da Silva Neves Carvalho, concordou com a existência de casos assintomáticos na Cidade. Segundo ela, “todos nós estamos suscetíveis à leishmaniose. A diferença está na resistência de cada organismo. Uns, por estarem com baixa imunidade, desenvolvem a doença, outros não”, declarou.
Porém, ela faz algumas ressalvas ao estudo apresentado pela Fiocruz. “Desconheço esse artigo em específico. No entanto, é preciso mais de um artigo, mais estudos, mais pesquisas sobre o mesmo tema para que o assunto passe a ter relevância. Artigos sobre leishmaniose em diferentes aspectos são publicados todos os dias”, disse.
Em relação aos casos assintomáticos, Elenir informou que pouco será alterado nos trabalhos já desenvolvidos pelo Município. Ela também é contra o tratamento de pacientes sem sintomas. “O tratamento da leishmaniose é realizado, e aconselhado, apenas para os casos sintomáticos da leishmaniose. Estamos falando de um tratamento extremamente forte, que debilita bastante o paciente, principalmente a atividade renal. Nada será alterado no trabalho de combate à leishmaniose. Continuaremos com os trabalhos que seguem as normativas preconizadas pelo Ministério da Saúde”, explicou.
NOVO CASO
Em 2008, a Secretaria de Saúde encerrou o ano com 48 casos sintomáticos e, confirmados, de leishmaniose. Entre os pacientes, três pessoas morreram por conta da doença.
Já neste começo de ano, um novo caso foi detectado. Trata-se de um morador do bairro Nossa Senhora Aparecida. O caso, de acordo com a coordenadora da Vigilância Epidemiológica, Neide Hiroyuki, ainda não foi lançado no sistema do Município, já que o paciente iniciou o tratamento em outro município, Campo Grande. “Fomos informados sobre o caso pela irmã dele [paciente]. Agora estamos aguardando o encaminhamento dos documentos pela secretaria de Campo Grande, para que o caso seja lançado no nosso sistema”, explicou.
Neide completou dizendo que, mesmo sem a confirmação, uma equipe do setor de endemias já foi encaminhada à residência do paciente para o trabalho de orientação, limpeza e borrifação.
Do começo do ano até hoje, o Município registrou cinco casos de suspeita de leishmaniose, quatro em janeiro e uma em fevereiro, mas nenhuma delas foi confirmada.
PONTOS CRÍTICOS
As inúmeras formas de se prevenir a leishmaniose já são conhecidas por quase toda a maioria. Mesmo assim, a secretaria de Saúde reforça: “As pessoas não devem criar galinhas e porcos em área urbana e limpar todas as folhas derrubadas pelos ventos, ou de podas. E Não deixar matéria em decomposição (frutas e outras) em quintais, já que o mosquito se aproveita de locais úmidos e escuros para se proliferar”, explicou.
Atualmente, o Município lida com quatro pontos críticos de infestação do mosquito transmissor da leishmaniose: Vila Haro, Jardim Maristela, Jardim das Oliveiras e São José, segundo o coordenador de Endemias, Wilson Roberto Pereira Mendes.
Os bairros, identificados por meio de armadilhas espalhadas pela Cidade, já recebem atenção especial da Saúde. “Com o período de chuvas, essas doenças [dengue e leishmaniose] voltam a ser motivo de preocupação. Nestes locais, principalmente, já entramos com o trabalho de educação, vistorias e borrifação”, explicou Mendes. Hoje, os agentes borrifadores estão trabalhando nas residências da Vila Haro. “Temos que cortar a cadeia de transmissão”, finaliza Mendes.
Elenir também não descarta a possibilidade de aplicação de multas nos casos de reincidências em quintais com focos de ambas as doenças como meio de controlar a infestação dos mosquitos.