Com o fim do ano se aproximando, o número de animais abandonados tende a aumentar. Isso ocorre, principalmente, por causa das viagens de férias, nas quais as pessoas não têm como levar seus pets.
O Brasil é um dos líderes mundiais em índicies de abandono de animais. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2022, existiam cerca de 30 milhões de animais abandonados nas ruas do país. Sendo, aproximadamente, 10 milhões de gatos e 20 milhões de cachorros.
O número de cães e gatos no país é tão grande, que uma pesquisa do IBGE, em 2018, revelou que a população desses animais ultrapassava os 78 milhões, mais do que o dobro do total de crianças (0 a 12 anos) no Brasil, que chegava a 35,5 milhões.
O Conselho Federal de Medicina Veterinária define maus-tratos como qualquer ato que provoque dor ou sofrimento desnecessário ao animal, sendo esse ato direto ou indiretamente, e intencional ou por negligência.
O abandono de animais é crime desde 1998 no Brasil. Em 2020, para tentar diminuir os números de abandono e maus-tratos, foi aprovada a Lei Federal 14.064/20, que aumentou a pena por maus-tratos, com reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição da guarda do animal, quando se tratar de cão ou gato. E, para minimizar esse problema, desde 2015 vem sendo realizada a campanha “Dezembro Verde”, para conscientizar a população acerca do assunto.
Em Mato Grosso do Sul, um decreto publicado no último mês institui o programa de proteção da vida animal para combater maus-tratos a animais domésticos e de rua. O decreto prevê a regulamentação de políticas de proteção aos animais e permitir um diagnóstico de quantos animais abandonados o Estado tem. E, para entender melhor esse cenário, nós conversamos com o protetor independente e coordenador do grupo de apoio e proteção da causa animal, Bruno Nóbrega.
Nessa reta final do ano, teoricamente as pessoas ficam mais solidárias. Mas na hora de programar uma viagem, nem todo mundo se preocupa com seu pet. Qual o impacto dessa situação?
BRUNO NÓBREGA O maior período de abandono de animal é justamente no período das festas de fim de ano até fevereiro. Nesse tempo, nossas ONGs ficam superlotadas, além de ser crime abandonar pet na rua. Então, a gente pede para as pessoas terem consciência, terem um pouco desse espírito natalino e não abandonem seus animais. A gente vê vários vídeos circulando, as pessoas abrindo a porta do carro ou simplesmente abrem o portão da casa para o seu pet sair. Isso é cruel.
Esse abandono ocorre em um momento em que as pessoas estão confraternizando. Não deveria ser o contrário, aumentar o número de adoções?
BRUNO NÓBREGA As pessoas não se preparam muito para ter um pet. Tem uma responsabilidade por trás disso. As pessoas pensam que o animal é um brinquedo, que é descartável. Por exemplo, comprou o pet em uma feira e levou para o filho, só que o filho cresceu, foi embora de casa e depois simplesmente descarta. E a gente tem esse problema hoje na rua, de superpopulação por conta desses abandonos.
Existe um período que aumenta o número de casos de abandono de animais?
BRUNO NÓBREGA Várias pesquisas relacionam o aumento do abandono de animais nessa época do ano. É por isso que a gente pede encarecidamente para que as pessoas entrem em contato com o vizinho, com um amigo, com parente, e deixe a chave com alguém para alimentar seu pet. Ou então, quem tiver condições, deixa no hotel. Em alguns casos podem até entrar em contato com a gente. O importante é não abandonar seu animal, ele pode sofrer na rua, com doenças, atropelamento, fome. Até uma futura adoção fica difícil. Muitas vezes esse bichinho vai permanecer o resto da vida com outros 200, 300 animais em em uma ONG superlotada.
Quando começou essa campanha do Dezembro Verde ? E como ela irá funcionar?
BRUNO NÓBREGA A campanha acontece desde 2015. Este ano, na Capital, estaremos com uma blitz educativa no centro da cidade, na rua 14 de julho com a avenida Afonso Pena, junto com equipes da Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Ambientais e de Atendimento ao Turista (Decat) e do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ). Também estaremos em algumas escolas municipais e particulares, não só falando para as crianças e adolescentes sobre o Dezembro Verde, mas também orientando sobre a adoção responsável, sobre maus-tratos. Precisamos conscientizar ssas crianças para que elas sejam futuros guardiões de pets. Nós temos vários projetos com crianças, e elas chegam em casa e orientam os pais e avós a dar comida, água aos animais, falar que tem que colocar os pets na coleira. Quando disseminamos a informação, a tendência é aumentar os cuidados, o carinho, e a responsabilidade para com a tutela dos animais.
É uma geração que começa a ter um cuidado diferenciado com os animais. Você percebe isso?
BRUNO NÓBREGA Percebo. Temos o projeto ‘Essa Comunidade é o Bicho’, aonde vamos em comunidades carentes, e a gente leva um filme educativo de pets. Também levamos algumas veterinárias para falar sobre tudo. Às vezes as próprias crianças falam que o pet está sem água, sem precisar a Decat ou a polícia ir até o local, a própria criança orienta o familiar. São em média 30 denúncias por dia, e a gente não consegue atender todas. Então, esses futuros guardiões ajudarão a diminuir as denúncias.
Como e onde as pessoas podem denunciar as questões de abandono de animais?
BRUNO NÓBREGA As denúncias podem ser feitas na Decat, Polícia Militar e Ambiental, ou no 190 mesmo. Estamos até conversando com o Governo do Estado para a criação de uma patrulha verde. Hoje, infelizmente, temos só dois agentes na Decat e eles não conseguem atender as denúncias de maus-tratos do estado inteiro. Geralmente vamos com algumas equipes antes para analisar as denúncias e verificar se são denúncias passíveis de notificações ou de detenções. Lembrando que maus-tratos é crime, sujeito a pena de dois a cinco anos. O abandono também é crime, sujeito a multas. Então, se você ver alguém descartando animais, tanto filhote, como adulto, denuncie. Em algumas cidades já há a patrulha verde, como em Campinas, e essa patrulha dá o suporte para a equipe policial. Mas há casos também em que as pessoas não gostam do vizinho e aí denunciam falando que o cachorro do vizinho late muito e suspeitam que está sofrendo maus-tratos. Muitas vezes, quando a polícia chega ao local, se depara com uma briga de vizinho. Apenas uma orientação ou notificação resolveria o caso.