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Três Lagoas

Autoridades apoiam maioridade penal, mas com ressalvas

Um dos principais pontos a ser trabalhado é o processo de reinserção na sociedade

Maioria dos adolescentes infratores tem envolvimento com drogas -
Maioria dos adolescentes infratores tem envolvimento com drogas -

Recentemente, o tema da maioridade penal voltou a ocupar espaço na mídia. A polêmica ressurgiu, assim como em outras situações do passado, depois que um jovem de classe média foi assassinado após um roubo por um adolescente, em São Paulo. O infrator faria 18 anos dentro de três dias. A morte desencadeou uma série de protestos solicitando a revisão da maioridade penal, conquistando, inclusive, o apoio do governador daquele estado, Geraldo Alkmin, que pretende apresentar projeto de revisão do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). 

Em Três Lagoas, autoridades ligadas à segurança pública são favoráveis à revisão da maioridade penal para adolescentes a partir de 16 anos. Porém, com algumas ressalvas.


Para o coronel Wilson Sérgio Monari, comandante do 2º Batalhão da Polícia Militar, um adolescente de 16 anos é capaz de ter consciência de seus atos. Logo, ele deveria ser responsabilizado como se fosse adulto. Entretanto, em um sistema diferenciado. “As penas realmente precisam ser revistas. Nosso código é muito antigo. Naquele tempo, a mentalidade dos jovens era outra. Hoje, um adolescente de 16 anos é totalmente capaz de distinguir o que é certo ou errado. Ele sabe o que está fazendo. Eles podem votar, então, podem ser responsabilizados”, disse.


Monari ainda completa: “No entanto, sou favorável a que o cumprimento dessa medida socioeducativa seja em local diferenciado até que ele atinja a idade máxima [21 anos]. Além disso, o Estado deve cumprir o seu papel e investir para que esse adolescente seja, de fato, recuperado, através da realização de cursos e, por consequência, a inserção no mercado de trabalho”.


De acordo com Monari, o índice de adolescentes envolvidos em crimes é alto em Três Lagoas. Ele citou o exemplo de um adolescente que possui mais de 20 passagens pela polícia, a maioria por furto. Ele completou 18 anos em fevereiro e já está na Penitenciária de Segurança Média. “Além dos casos em que ele não foi detido em flagrante. Essas 20 passagens são apenas na Polícia Militar”, completou.


Na maioria das vezes em que foi detido, o rapaz, que é dependente químico, foi liberado. O adolescente infrator só é apreendido em flagrante em casos considerados violentos. Caso contrário, ele é liberado imediatamente e caberá à Justiça o pedido de internação. Além disso, a pena máxima para um adolescente não ultrapassa três anos.


DELITOS
A maioria dos delitos praticados por adolescentes, segundo Monari, é de furto, seguido do tráfico de drogas. Para se ter uma base, dados da PM apontam que, apenas no primeiro trimestre, 15 adolescentes com idade entre 12 e 18 anos foram detidos por furto; outros 30 por tráfico ou posse de drogas e dez por roubo. “Boa parte desses delitos é cometido para manter a dependência química, outro problema grave. Esses garotos furtam para manter o vício. Isso faz com que deixe de ser caso de segurança e passe a ser um caso de saúde”, lembrou.


De acordo com o tenente-coronel, a maioria dos adolescentes apreendidos em Três Lagoas tem de 15 a 17 anos, é de classe baixa e vem de famílias em que há ausência de pelo menos um dos pais. Além disso, muitos abandonaram a escola e quase nenhum trabalha.


IMPUNIDADE
Opinião semelhante é dividida pelo delegado regional Vitor José Fernandes Lopes. De acordo com ele, as penalidades aplicadas atualmente aumentam a sensação de impunidade desses adolescentes e fazem disparar o índice de reincidência. “O adolescente chega à delegacia sabendo que nada acontecerá. Há jovens com mais de 30 passagens pela polícia”.


Pesquisa divulgada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2012 apontou que 43% dos adolescentes em cumprimento de medida de internação já haviam sido internados pelo menos uma vez.


Na Polícia Civil, são registrados aproximadamente 40 casos de atos infracionais, ou seja, crimes cometidos por adolescentes, por mês. Esses casos englobam tudo, de lesão corporal a adolescentes no volante. Mas a maioria, assim como na PM, abrange furtos e tráfico de drogas.


Para o delegado, a revisão da maioridade penal é realmente necessária. Mas, assim como Monari, desde que dotadas de dispositivos de reeducação. “O ideal é que acima dos 16, como ele tem plena consciência dos seus atos, tanto quanto o maior de 18, deva responder normalmente como se maior fosse. Mas é preciso deixar esses jovens em unidades especiais para se tentar recuperados. Não basta simplesmente segregá-los, como tem sido feito no nosso sistema penitenciário”, destacou.


Segundo o delegado, o uso de drogas entre esses garotos é grande, “para não dizer total”. “Quase todos esses garotos têm ligação direta ou indireta com o tráfico”.

 

CONTATO COM DROGAS
O único que informou ser contra a maioridade penal para adolescente de 16 anos foi o diretor da Unei de Três Lagoas, João Batista Pinheiro. Na área, há 24 anos, o diretor explica que, aos 16 anos, o caráter do adolescente ainda está em desenvolvimento. “Não é punindo o menor já aos 16 anos que resolveria o problema. Hoje, temos que verificar a situação do maior que utiliza esse menor. Teria que ser revisto o nosso código penal e as penas para esses bandidos”, explicou.
Atualmente, a Unei de Três Lagoas está com 12 adolescentes, capacidade máxima da instituição desde que foi parcialmente interditada pela Justiça em 2009 por conta das péssimas condições de infraestrutura.
Segundo Pinheiro, quase a totalidade desses garotos tem ou tiveram contato com drogas e “é por isso que cometeram os delitos”. 
Atualmente, está em fase de construção a nova Unei de Três lagoas. A unidade, que está com 50% do projeto concluída, poderá fornecer melhores condições de ressocialização desses jovens. O projeto, explicou o diretor, segue as determinações nacionais de medidas socioeducativas.
O novo prédio terá capacidade para abrigar até 70 adolescentes. Desse total, 10 da unidade provisória – com internação de até 45 dias, até a determinação da medida socioeducativa a ser cumprida – e 58 em cumprimento da punição.