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Lockdown

Devemos priorizar o direito à vida’, defende presidente da OAB-MS

Mansour Elias Karmouche esclareceu sobre direitos em meio à pandemia da Covid-19 e decretos que restringem atividades

Mansour Elias Karmouche esclareceu sobre direitos em meio à pandemia da Covid-19 e decretos que restringem atividades - Arquivo / JPNews
Mansour Elias Karmouche esclareceu sobre direitos em meio à pandemia da Covid-19 e decretos que restringem atividades - Arquivo / JPNews

A pandemia da Covid-19 mudou a dinâmica do nosso cotidiano e chegou impondo medidas que antes não éramos acostumados.

Entre essas alterações, está a restrição da circulação de pessoas em todo o mundo. Diversos países adotaram o fechamento total, também chamado ‘lockdown’, para conter o avanço da doença que, só no Brasil, matou mais de 300 mil pessoas. Essa restrição que se fez necessária vem causando questionamentos a respeito de um direito previsto na Constituição Federal, o de ir e vir.

As discussões em torno do tema ocorrem em um momento em que o direito à saúde é uma das peças mais fundamentais para garantir a vida da população. Em entrevista à jornalista Ingrid Rocha, da CBN Campo Grande, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil em Mato Grosso do Sul (OAB-MS), Mansour Elias Karmouche, falou sobre o assunto.

“Nós temos um direito maior que é o direito à Saúde. Ele pode se sobrepor em determinados momentos em relação ao direito de ir e vir. (…)Devemos priorizar a vida nesse momento”, explica. Confira a entrevista na íntegra e entenda sobre aspectos de direitos em meio à pandemia da Covid-19.

As restrições de circulação de pessoas para conter o avanço da pandemia da Covid-19 no Brasil ferem o direito de ir e vir?
KARMOUCHE
Na verdade, nós temos um direito maior que é o direito à Saúde que, muitas vezes, não é absoluto, mas é relativo. Ele pode se sobrepor, em determinados momentos, com relação ao direito de ir e vir com determinadas restrições. Por óbvio, nós analisamos, quando existe algum tipo de excesso, medidas para prevalecer um sobre o outro. Mas, determinadas situações colocam um direito em conflito com outro. E é por conta disso que se avalia [a situação], para se falar qual é o direito que deve ser preservado agora. Nesse momento, o direito à Saúde pública está sobrepondo. Mas, tudo deve ser avaliado de acordo com a circunstância. Não existe absolutismo em nenhuma dessas vertentes.

Para reforçar, podemos dizer que o direito à saúde, neste momento, prevalece em relação aos outros direitos?
karmouche
Neste momento, sim. Precisamos deixar clara essa situação porque existem muitos questionamentos vindos, principalmente, dos profissionais de direito, que conhecem muito. Sabemos que outros estados priorizam neste momento o direito de ir e vir. Então, tivemos um agravamento muito grande [da pandemia] e temos como exemplo Manaus. E o que aconteceu? Se pagou com a vida. Nós devemos levar em consideração, primeiro, a vida do ser humano. Então, se isso está sendo colocado em risco neste momento, devemos priorizar o direito à vida. 

O que as pessoas precisam entender quando nos encontramos em um momento como esse de pandemia?:
KARMOUCHE
Estamos vivendo uma situação que no século XXI nós não tínhamos presenciado. Se você for analisar, nós tivemos outra grande pandemia que foi a gripe espanhola, em 1918, há 100 anos. Então, nós não tivemos uma situação como aquela no atual mundo contemporâneo que vivemos. As pessoas estão acostumadas, estão vivendo sob o pálio do estado democrático de direito e, depois da Constituição de 1988, nós tivemos assegurados muitos direitos. E, lógico que ninguém abre mão desses direitos e jamais abriria. Agora, o que nós temos que entender é que temos uma situação diferente. Às vezes, as pessoas falam que vai virar comunismo, começam narrativas de todos os lados querendo impor uma narrativa diante de uma circunstância fática real. Não podemos perder a noção entre a realidade que estamos vivendo e, possivelmente, uma outra narrativa ideológica. Estamos vivendo dois mundos, o paralelo e o real. O real é esse onde você está vendo as pessoas morrerem por falta de um respirador, de um leito de UTI. Esse é o mundo real. Agora, nós temos um mundo paralelo, em que as pessoas têm direito de imaginar isso. Eu não julgo as pessoas que imaginam que podemos ter um outro desenho político. Não julgo essas pessoas porque elas têm o direito de pensar e, até, de se expressar em relação a isso. Agora, circunstancialmente, nós temos uma situação fática que nos leva a criar essa situação que o governo impôs de restrições, com deslocamento em determinados períodos. 

Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro comparou algumas medidas dos governadores como “estado de sítio”. Qual sua avaliação sobre esse tipo de comparação?
KARMOUCHE
A comparação que ele faz não leva em consideração a última decisão do STF. Então, hoje, esse estado de sítio ficaria restrito a um estado de guerra. E falo guerra civil ou entre nações. Eu não entendo que esse caso seria que somente ele [o presidente] que poderia decretar essas medidas, porque o Supremo acabou decidindo. Mas, quem dá a última palavra, por enquanto, é o STF. Se ele já disse que existe a competência concorrente do estados e municípios, acabou. Acho que essa narrativa dele [presidente] dirige ao público dele. Não vou questionar, também, o papel dele. Nós tivemos no passado outros políticos que repudiavam a própria gripe aviária. Tivemos diversos gestores que adotaram diferentes posicionamentos diante de uma crise. Então, o papel do político, muitas vezes, é acalmar a população e é o que está faltando, hoje.