O número de casos de violência contra médicos durante o trabalho tem mobilizado a categoria em todo o país. Segundo dados do Conselho Federal de Medicina (CFM), a cada três horas um médico sofre algum tipo de violência enquanto desempenha sua função.
Em Mato Grosso do Sul, conforme o 2º Secretário do Conselho Regional de Medicina (CRM), Flávio Freitas Barbosa, este ano, já foram registrados quase mil Boletins de Ocorrência onde os profissionais constam como vítimas de algum tipo de violência. O cenário coloca o estado como o 9º do país quando o assunto é agressão contra profissionais médicos. Recentemente um médico foi assassinado em um posto de saúde no município de Douradina, no sul do estado. A situação mobilizou toda a sociedade.
Como o CRM avalia essa situação aqui no estado?
FLÁVIO BARBOSA Nós ficamos muito surpresos. O índice aumentou absurdamente. Então, a cada 3 horas um médico sofre agressão no seu trabalho, no dia a dia, na sua profissão, seja agressão física, verbal ou até mesmo essa fatalidade que ocorreu aqui no nosso estado, com o médico em Douradina.
O que pode estar havendo?
FLÁVIO BARBOSA O CFM levou projetos ao Congresso Nacional para deputados que já têm projetos no sentido de penalizar aquelas pessoas que, de alguma forma, exerçam qualquer tipo de agressão contra o médico no seu ambiente de trabalho. O que se concluiu primeiramente foi uma mudança do perfil das pessoas. Nós estamos vivendo um mundo de imediatismo. O século mudou. Esta é outra geração e há necessidade de resposta rápida. Então, os locais que mais possuem o índice de violência são os hospitais. E as unidades básicas, principalmente no SUS. Os hospitais públicos têm índice de violência maior do que o privado.
As pessoas não conseguem esperar por atendimento?
FLÁVIO BARBOSA Em algumas situações, a violência não ocorre necessariamente por parte do paciente e sim de acompanhante, familiares, talvez naquele momento de muito estresse, pode ocorrer num pronto-socorro, num CTI, naquela fragilidade que a pessoa passa naquele momento. Hoje, temos tudo muito rápido na mão, e a medicina é feita não com rapidez, ela tem que ser feita com qualidade. Para ter qualidade, tem que ter boa formação e boa estrutura.
Nos locais em que ocorrem a violência, o motivo é a demora?
FLÁVIO BARBOSA É uma questão estrutural, que vai desde equipamentos, suprimentos até a mão de obra – a quantidade de profissionais seja o médico, o enfermeiro, o técnico de enfermagem. Aqui em Campo Grande, um dado rápido, nós temos unidades básicas de saúde de algumas regiões que têm dificuldade com a escala, porque lá tem um histórico de violência naquela região.
Pode citar alguma?
FLÁVIO BARBOSA As unidades mais ao sul – Mário Covas, Macaúbas, o Dom Antônio Barbosa, Marabá, unidade Dona Neta, que é aqui no centro da cidade. Dependendo da localidade pode ocorrer isso, aliado à essa questão do dimensionamento dos profissionais. Se você chega na unidade que ela está lotada e tem apenas um médico para atender a demora, obviamente, vai ocorrer.
Há alguma informação de médico querendo migrar de unidades ou mesmo desistindo da profissão?
FLÁVIO BARBOSA Olha, existem casos de médicos que já abandonaram a profissão, de outros que trocaram de especialidade. Tem colega que passa por um trauma, o que pode mudar completamente a vida do médico, que entra em quadro de depressão, angústia, isolamento social.
Se fala muito no glamour da profissão, mas a prática não tem sido bem assim?
FLÁVIO BARBOSA É aquilo que vemos nos mais jovens. Da faculdade, todo mundo imagina formar e ter um consultório lindo, maravilhoso, poder atender os pacientes com qualidade por hora. Mas a gente vê que na prática não é isso. A cada dia, tem um número maior de médicos e, teoricamente, quanto mais médicos imagino que teria mais saúde, que teria mais atendimento, mas vemos que a coisa vem piorando, até porque a formação do médico não é mais igual.
Como o CRM hoje atua em Mato Grosso do Sul ?
FLÁVIO BARBOSA Com esse novo dado atualizado do ano 2024, dentro da educação continuada, que é um setor um braço do Conselho Regional de Medicina, que são os cursos de ética para os médicos. Nós vamos fazer 3 jornadas no interior do estado, em Três Lagoas, Dourados e possivelmente Ponta Porã. E abordar o tema segurança do médico, para que tenha o conhecimento sobre como se precaver e acontecer alguma violência com ele, o que fazer, quem ele tem que procurar, de que forma que tem que procurar, qual é o amparo.
Existe algum Projeto de Lei sobre a questão da violência contra profissionais da saúde?
FLÁVIO BARBOSA Nós temos a frente parlamentar da medicina no Congresso Nacional, que hoje é compostos por 64 deputados e senadores que são médicos. Nós entregamos esses dados a dois deputados federais, que têm projeto nesse sentido. Somente a lei específica para onde e quando isso ocorrer, seja com o médico, com enfermeira, com o dentista poder´´a frear esses casos de agressão. Esse é um projeto que tramita rápido, tem tudo para ocorrer o ano que vem a nível de projetos. No total, temos 428 projetos em relação à medicina no país: Questão de recolhimento de imposto, da carreira médica, do concurso público, da valorização da rede de atenção básica, dos programas de incentivo, a dificuldade de lotação em locais de difícil acesso. Tem vários projetos hoje tramitando na Câmara do Congresso Nacional.