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Três Lagoas

Mestre Armando: da segunda guerra ao principal projeto social de Três Lagoas

Mestre Armando Catrana -
Mestre Armando Catrana -

Ele é coordenador do Centro Juvenil e de Formação Profissional “Jesus Adolescente”, fundado em 2002 na Vila Piloto. Veio para Três Lagoas com a missão de contribuir para a educação e formação profissional das crianças e jovens. Escolheu instalar o projeto na Vila Piloto, por ser um bairro populoso e com grande número de crianças e jovens em situação de risco social. Na entrevista especial da semana, o Jornal do Povo conversou com o salesiano Irmão Armando Catrana, que conta um pouco da sua vida e do projeto socioeducativo que funciona na Vila Piloto. Nesse mês de agosto, ele completou 50 anos de vida consagrada.

Jornal do Povo– Quem é mestre Armando Catrana?
Mestre Armando– Tenho 75 anos, nasci em Perúgia, na Itália. Sou de uma família extremante católica, muito religiosa que sempre pôde oferecer aos filhos segurança afetiva. Motivos que fizeram com que passássemos pela segunda Guerra Mundial tranquilamente. Na juventude, sempre trabalhei, estudei e pratiquei muita atividade esportiva e de teatro. Servi à Aeronáutica Italiana por 18 meses, quando sai, depois de alguns meses entrei em um banco importante de minha cidade. Depois de alguns meses me demiti para entrar no Salesiano para ser filho de Dom Bosco, dedicando minha vida a educação da juventude. Depois de cinco anos de formação na Itália, em 1968, vim para o Brasil.

JP-O senhor veio para qual lugar do Brasil?
Mestre Armando– Vim para a cidade de Pochorel em Mato Grosso, onde permaneci por 24 anos, e depois me destinaram para Três Lagoas.

JP– Quando veio para Três Lagoas?
Mestre Armando– Cheguei a Três Lagoas em 2002 para fazer um trabalho com jovens. O espaço que juguei mais necessitado para o meu tipo de trabalho, em um ambiente popular, com meninos com vários tipos de problemas, foi a Vila Piloto. Esse terreno foi cedido por 99 anos para fazer esse trabalho com os jovens. Começamos devagar, construindo um pedacinho de cada vez. Em 2003, já estava funcionando completamente o Oratório, com um número muito grande de participantes. Em 2005, iniciamos à atividade de formação profissional, com pequenas oficinas, depois fomos crescendo. A cada ano passa pela escola profissional uma média de 800 a mil pessoas. Temos também o Oratório Centro Juvenil para crianças e adolescentes. Todo início de ano recebemos mais de mil inscrições. Esse ano tivemos apenas 490 inscritos, desses só a metade frequenta com regularidade. Outros são paraquedistas, que só vêm quando têm uma atividade diferente e não querem aceitar a proposta educativa cristã. Oferecemos nove atividades esportivas e quatro atividades artísticas. Eles frequentam aqui em período diferenciado das escolas.

JP– Esse projeto contribui para ocupar a mente dessas crianças e jovens e ajuda para que eles possam ficar longe das ruas?
Mestre Armando -Sim, mas é uma coisa momentânea, porque para proteger dos perigosdas ruas, da sociedade que não oferece alternativas educativas e positivas, só isso não basta. Aliás, ultimamente, a sociedade é formada por mazelas de todos os tipos, como drogas, violência, falta de respeito, entre outras questões. Para proteger,realmente não é só vir aqui e brincar. Para evitar o mal, devemos dar estrutura moral, de vontade educativa, e que leva o garoto amanhã escolher o que é bom, assim como evitar o que necessário. Não podemos proteger apenas em uma redoma de vidro. Deve ser oferecido meio para os jovens se defenderem e passar incólume no meio de uma sociedade,às vezesperversa, e que abrecaminhos perigosos e, até sem volta.

JP– Aqui é mantido por quem?
Mestre Armando -Através do mestre Armando,  que tem uma família que opera no mundo inteiro em prol da juventude, que é a Missão Salesiana de Campo Grande e o grupo AmiciArmando da Itália [grupo de empresários italianos que fazem doações ao projeto social] . Aqui em Três Lagoas contamos com o apoio da Prefeitura. Desde que começamos trabalhar, a Simone Tebet, nos procurou e ofereceu a possibilidade de ajuda financeira e, até hoje a Prefeitura nos ajuda financeiramente. Essa contribuição nos permite ir em frente. Diante dessa crise financeira, a ajuda que chega da Itália é bem reduzida. Então, se não tivesse essa ajuda financeira que chega da Prefeitura e colaboração da Petrobras seria extremante difícil oferecer tantas alternativas para os jovens. 

JP– Os jovens que passam pelo projeto, saem mais preparados para enfrentar o mundo?
Mestre Armando -Trabalhamos para isso, mas depende muito da adesão pessoal do garoto e da família, em saber motivar e colaborar. Por motivo de ordem política, a família não apoia e não incentiva. Se não existe colaboração para isso, não podemos esperar grandes resultados. Infelizmente, no nosso bairro e os bairros vizinhos, nem sempre as famílias mostram interesse e reconhecem a validade da nossa intervenção, ficam na janela para ver como vai acabar. Não frequentam a escola e nem o Centro Juvenil, só querem saber se o filho vai passar. Sei que a proposta que apresentamos, deve dar resultados, provavelmente nada será perdido diante de todo esforço educativo que tentamos fazer. Agora, não sei até que ponto e quando, acontecerão as mudanças, mas, certamente alguém recolherá as sementes do nosso semear.

JP– O senhor percebe alguma mudança na comunidade depois da implantação do Centro Juvenil aqui na Vila Piloto?
Mestre Armando– Depois da chegada do Centro Juvenil as coisas melhoraram, mas depende muito do garoto, se vai aceitar as propostas. Se procura só diversão, é difícil, mas se procuram além disso, certamente vão se dar bem na vida. Temos muitos jovens que se deram bem na vida e profissionalmente, mas temos muitos jovens também que estão na cadeia. Agora, eu não devo cansar, não devo esmorecer, devo ficar aberto para acolher, receber, e estender às mãos a todos. Continuarei trabalhando, não sei até quando, já tenho mais de 70 anos.

JP-O senhor deixou bem claro que a família é fundamental no processo de educação dos filhos, porque?
Mestre Armando-Sim, não podem achar que somente o projeto e a escola têm obrigação de educar. A escola, a família, as igrejas, é um todo. Muitos garotos já não escutam mais. Eles querem ver exemplos, e o mundo dos adultos não está oferecendobons exemplo aos jovens.

JP-Quanto às drogas, qual a sua análise?
Mestre Armando – As drogas são um dos maiores problemas enfrentando pela sociedade. Isso ainda tem um peso muito dramáticona sociedade. Digo que é um dos grandes problemas, porque as drogas abrem caminho para outros tipos de problemas.  Têm jovens que saíram daqui e se tornaram traficantes, ou colaboradores do tráfico.  

JP– Aqui na Missão Salesiana, é abordado essa questão das drogas?
Mestre Armando -O nosso trabalho é prevenir. Eu não tenho condições físicas, psicológicas e nem estruturais para lutar contra as drogas, a não ser prevenir e dizer os males que pode trazer na vida da pessoa, seja como traficante ou usuário. Vós que grita no deserto, quem escuta? Quantos escutaram João Batista e Jesus Cristo, assim como as igrejas? Alguns dos mais sensíveis escutam e aceitam as propostas, outros acham que é discurso de careta. A maioria não está nem aí. O garoto quando começa a ter 14, 15 anos, fica mais atraído pela força do álcool, da droga, da violência, do roubo… Hoje, muitos pensam que não é mais convincente ganhar na base das oito horas de trabalho pesado e sacrificado, isso não é muita perspectiva para muitos jovens, já que se ganham muito mais em uma pequena vigem com um pequeno carregamento de drogas do que ficar alguns meses trabalhando no pesado. Estamos lutando com palito contra canhões atômicos, para se fazer uma comparação. Mas, ainda acredito na força do bem. Existem muitos garotos lutando para ter uma vida digna, lutando para vencer na vida e não deixar se levar por um tipo de sociedade consumista que impõe certos modelos, que é perigoso.