Uma das maiores representantes do empreendedorismo feminino, a bioquímica Janete Vaz, co-fundadora e presidente do Conselho de Administração do Grupo Sabin, um dos maiores players no setor de medicina diagnóstica do país, têm percorrido diversos países, principalmente na Europa, para incentivar a participação das mulheres no mercado de trabalho. O empreendimento começou com apenas três funcionários na década de 80 e, atualmente, reúne mais de sete mil trabalhadores, na maioria mulheres – 77% do quadro funcional, que ocupam 74% dos cargos de liderança. Nesta semana, a empresária esteve em Campo Grande para participar do 1º Encontro de Mulheres Empreendedoras, promovido pelo Sebrae, como parte das comemorações do dia 8 de Março, dia Internacional da Mulher. Assim que desembarcou na Capital, o primeiro compromisso foi uma entrevista para a Rádio CBN Campo Grande. Acompanhe alguns pontos principais.
Como foi o início dessa trajetória de sucesso, de empreendedorismo?
JANETE VAZ Quando o Sabin começou eu estava muito novinha. Eu gosto de falar sobre isso para os jovens que estão estudando, porque eu estava com 29 anos só. Eu tinha um diploma, eu tinha um sonho e eu achei uma amiga pra sonhar junto, porque começar um negócio não é fácil. Eu tinha um sonho, que era abrir meu negócio, porque eu achava que o meu pai conseguiu realizar tudo sozinho e por que eu não poderia realizar sozinha o meu negócio?
Não teve nenhuma herança?
JANETE VAZ Não, não. Eu mudei pra Brasília em 1980, eu sou do interior de Goiás. Morei em fazenda até 10 anos de idade e meu pai foi o meu guru, o meu grande mestre, aquele que me ensinou de verdade a fazer negócio. Eu aprendi a fazer negócio no alpendre da casa da fazenda, vendo o meu pai plantar, separar boi e fazer negócio de boi. Então, esse foi meu aprendizado.
Foram os valores, que a senhora trouxe de casa, que te conduziram para o sucesso?
JANETE VAZ São os princípios e valores que eu aprendi com meu pai e minha mãe.Quando falam de Instituto Sabin, é a minha mãe. Minha mãe que é a cuidadora, que zela, a que olha tudo, a que cuida da família. O pai da mamãe, veio de Minas pra Goiás e a minha vó estava grávida do oitavo filho que faleceu no parto. Então, a minha mãe, que era a filha mais velha, cuidou de todos. Essa essência do cuidado, de estar observando todo mundo, de valorizar as pessoas, de ter zelo pelas pessoas, vem desse DNA da mamãe. O Sabin tem muito isso, esse lado humano muito aguçado. Você falou de 77% de mulheres e essa pluralidade, essa diversidade feminina é muito importante nos negócios também. E isso tem um diferencial pra saúde. A saúde, em essência, é um setor social, você cuida do bem mais precioso das pessoas. Se elas não tiverem bem de saúde as demais coisas vão sofrer impacto também. Então, a gente cuida do bem mais essencial das pessoas que é a saúde.
Quando a senhora começou o seu negócio, poucas mulheres despontavam no mercado de trabalho. E hoje a gente vive uma realidade diferente, com muitas empreendedoras e mulheres em cargo de gestão também. Como a senhora acompanha essa mudança? Acha que ainda falta um pouco mais de justiça no mercado de trabalho com as mulheres?
JANETE VAZ Você acredita que eu nunca percebi isto? Eu venho de uma geração de mulheres empreendedoras, de mulheres que assumem os negócios. A minha avó, ela é de 1913, ela vendeu Avon até 80 de idade. A vovó era a maior vendedora de Avon do estado de Goiás. Ela ganhava geladeira, televisão. E eu assisti a minha vó trabalhando o tempo todo. Eu tenho duas tias paternas que eram mantenedoras do lar, então, todas as netas da minha avó, todas, sem exceção, fizeram faculdade, formaram e trabalharam. Eu só fui perceber que existia essa diferença entre homens e mulheres no mundo dos negócios muito tempo depois. Não havia percebido que isso era uma dificuldade para as mulheres. E essa hoje é a minha bandeira porque, se foi coragem, a gente precisou ter. Se foi garra, a gente teve muita. A mulher, ela tem vários pilares, ela precisa de ter equilíbrio pra administrar seus pilares? Ela precisa determinar o que que é prioridade pra ela. Existem momentos em que a sua família é sua prioridade, mas você precisa levar com muito equilíbrio cada pilar que você vai executar na sua na sua vida, em cada momento. Então, esse é o diferencial de como conduzir. Agora, em relação ao que aconteceu com as mulheres nos últimos anos, eu acho que a gente avançou muito e nós precisamos aplaudir o que já avançamos, mas nós ainda temos uma longa jornada pela frente, para conquistar mais espaços, para ser mais reconhecidas, para ter mais abertura. Eu vejo que há uma certa dificuldade em você abrir espaço para as mulheres. As mulheres não tem tanta oportunidade como têm os homens. Na hora dos convites, na hora da seleção de executivos, se tiver um homem e uma mulher, a tendência é buscar o homem. E eu vejo, agora, nos últimos cinco anos – você falou mudou – e mudou mesmo. A pauta entrou para a mesa dos conselhos, a pauta entrou pra mesa dos executivos, na busca de diversidade não só da mulher mas a questão ambiental, dos gêneros, são essas três coisas que hoje estão na pauta de todo presidente, de todo executivo. Eu falo que algumas palavras o Sabin sempre usou; compliance nós praticamos a vida inteira, a governança ela não era estruturada, escrita, mas era praticada, resiliência é uma coisa que as mulheres precisam de entender que nós vamos enfrentar o tempo inteiro e a gente precisa de ter coragem o tempo todo para enfrentar esses desafios que temos pela frente. Então, é ir adiante entendendo que as respostas que nós precisamos estão ali depois do primeiro passo. Enquanto você não der o primeiro passo, você não vai conseguir suas respostas. E a gente precisa de ter audácia para ir buscar conhecimento, né? Buscar estudar, capacitação para você se adiantar, para você poder ter segurança nas suas decisões, para você ser mais assertiva no seu dia a dia.
E eu já estou tirando aqui algumas lições bárbaras dessa nossa conversa. Sonhar, ter coragem, determinação, foco, propósito e se capacitar. É esse o caminho, né?
JANETE VAZ Sonhar pequeno e sonhar grande dá o mesmo trabalho. Então, busque aquilo que você quer. Como é que você quer ser? Qual é o seu jeito de ser? Isso vai fazendo a sua marca pessoal, isso vai fazendo a marca da sua empresa, vai te deixando transparente? As pessoas já vão olhando em você e te enxergando, enxergando a sua forma de fazer gestão, a sua forma de fazer o seu dia a dia.
Hoje, as mulheres querem igualdade na hora de disputar uma vaga. Essa concorrência com o sexo oposto estaria ainda desleal?
JANETE VAZ É mais do que isso, minha filha, porque hoje, infelizmente, ainda existe aquela mulher que atrapalha o crescimento de outra mulher. Então, o que a gente quer é exatamente trabalhar o conceito, a mudança de comportamento das mulheres, porque há mais mulheres do que homens e nós não colocamos mais mulheres parlamentares. Por que nós mesmas não decidimos pelas mulheres? Nós precisamos, como mulheres, abraçar as mulheres, ajudar as mulheres, levar coragem para essas mulheres, levar conhecimento. A mulher, ela acha que, pra ela assumir, por exemplo, um cargo, ela precisa de conhecer tudo antes. Já o homem vai lá e ele erra, ele aprende. Mas a mulher quer ser perfeccionista, ela quer aprender primeiro. Ela não tem coragem, ela não levanta a mão, ela é a última que aceita. Esse comportamento que a gente quer mudar. Por isso que eu falo de coragem, por isso que eu falo de busca da felicidade, por isso que eu falo de sonho, porque quando você tem um sonho, você precisa lutar por este sonho. E felicidade é você ter a liberdade de pensar, falar e fazer. Quando você pensa, fala e faz, vai trazer uma felicidade imensurável com a realização que você consegue.