Depois do episódio dramático protagonizado por ativistas ligados à proteção animal no Porto de Santos, em Janeiro deste ano, na tentativa de impedir que 25 mil bois fossem embarcados vivos para a Turquia alegando maus tratos, a prefeitura do município do litoral paulista sancionou lei proibindo o trânsito de animais.
O caso foi parar no STF e, ontem, o ministro Edson Fachin concedeu liminar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 514 para suspender a eficácia de dispositivo da Lei Complementar 996/2018, do Município de Santos (SP), que proíbe o trânsito de veículos transportando cargas vivas nas áreas urbanas e de expansão urbana da cidade.
A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) ajuizou ação sob a alegação de que a norma inviabiliza a atividade de exportação de produtos gerados pela pecuária brasileira através do Porto de Santos. A entidade destaca que a maior parte dos animais vivos exportados pelo porto vão para países mulçumanos, que importam apenas animais vivos em virtude de questão religiosa relacionada ao abate no “sistema” hallal. A entidade sustenta que os dispositivos atacados, ao restringirem de forma indireta o acesso ao porto, ferem competência privativa da União para legislar sobre comércio exterior e interestadual e regime de portos, bem como a competência material deste ente para a exploração de portos marítimos.
Para o ministro Edson Fachin, o legislador municipal, o prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), sob a alegação de criar mecanismos de proteção aos animais, impôs restrição desproporcional ao direito dos empresários do agronegócio de realizarem a sua atividade. “Esta desproporcionalidade fica evidente quando se analisa o arcabouço normativo federal que norteia a matéria, tendo em vista a gama de instrumentos estabelecidos para garantir, de um lado, a qualidade dos produtos destinados ao consumo pela população e, de outro, a existência digna e a ausência de sofrimento dos animais, tanto no transporte quanto no seu abate”, afirmou Fachin.
Ele citou que a Lei 8.171/1991 prevê que a ação governamental para o setor agrícola é organizada pela União, estados, Distrito Federal, territórios e municípios, cabendo ao governo federal a orientação normativa, as diretrizes nacionais e a execução das atividades estabelecidas em lei. Ao regulamentar a lei, explicou o ministro, o Decreto 5.741/2006 estabelece que é obrigatória a fiscalização do trânsito nacional e internacional, por qualquer via, de animais e vegetais, seus produtos e subprodutos, qualquer outro material derivado, equipamentos e implementos agrícolas, com vistas à avaliação das suas condições sanitárias e fitossanitárias, e de sua documentação de trânsito obrigatória.
O ministro apontou ainda que o periculum in mora (perigo da demora da decisão) está configurado tendo em vista a previsão da chegada de sete navios no território brasileiro (com capacidade de mais de 88 mil cabeças), sendo Santos um importante porto para escoamento da produção, “o que comprova que a demora no provimento trará graves danos, tanto sob o prisma econômico, quanto sob o viés de proteção e bem-estar dos animais envolvidos na atividade comercial”.
O relator concedeu liminar, a ser referendada pelo Plenário, suspendendo a eficácia do artigo 1º da Lei Complementar 996/2018, que proíbe o trânsito de veículos, sejam eles motorizados ou não, transportando cargas vivas nas áreas urbanas e de expansão urbana do município, e do inciso XVII do artigo 3º da norma, que proíbe transportar animais de forma inadequada ao seu bem-estar, como por exemplo em gaiolas, veículos, entre outros.